São Paulo, terça-feira, 4 de julho de 1995
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``Invasão russa" fracassa nos EUA

LUÍS ANTÔNIO GIRON
ENVIADO ESPECIAL A NOVA YORK

Às vezes o comunismo soviético deixa saudades. Pelo menos ele mantinha bem encarcerados, para o bem da humanidade, atrações como o quinteto de rock Mashina Vrêmeni e a cantora de jazz armênia Irena Otieva.
Otieva, 34, e Mashina Vrêmeni, 25 anos de carreira, se apresentaram anteontem, no Avery Fischer Hall de Nova York, no evento ``Russia on Hudson", penúltimo espetáculo do JVC Jazz Festival.
Dividiram o palco com o razoável grupo de jazz Allegro Ensemble, de Moscou. Pela primeira vez se apresentaram nos EUA grupos de jazz e rock da Rússia.
``Nossa intenção é invadir os EUA com os sons originais e originários da Rússia", disse o saxofonista russo Igor Butman, 33, antes de tocar com o Allegro e servir de mestre-de-cerimônias da noite. ``Temos qualidade musical e história para tanto."
Butman e amigos não lograram o intento. O teatro permaneceu vazio e os poucos não-russos que resistiram trataram de sair correndo ao aparecer o Mashina Vrêmeni, um grupo que só tem comparação no Brasil a Os Incríveis.
Ficou claro que o regime soviético não tinha nada de sério. Se não, não teria transformado músicos de bailinho em símbolos da resistência democrática.
E que resistência incrível.
Butman, que imigrou aos EUA em 1987, mostrou seu sotaque yankee irrepreensível. De início, já começou agradecendo a ``Voz da América", rádio onde os russos aprenderam jazz a partir do fim dos anos 50.
``Agora temos liberdade de pensar, tocar e viajar pelo mundo todo", disse Butman à Folha. ``Nossa única diferença em relação aos americanos é que não acreditamos em comerciais."
Por isso mesmo, Butman reveza seis meses em Nova York, onde faz negócios, com igual tempo em Moscou, onde faz música.
Butman reconhece que o jazz é música de elite também na Rússia. ``Trouxemos o Mashina Vrêmeni a pedido da comunidade russa de Manhattan, pelo apelo popular que o grupo tem."
Manhattan abriga hoje 12.5000 russos, segundo Butman. Poucos têm dinheiro e não foram capazes de encher o Avery Fischer Hall.
Butman e Allegro fizeram uma competente apresentação, embora sem sabor russo. Praticaram o puro jazz cover. O mesmo se deu com Otieva, que berrou ``Hot House", ``Night in Tunisia" e ``Summertime", valendo-se de ``scats" e outros recursos que desenvolveu ao ouvir a ``Voz da América".
Mais original foi a Mashina Vrêmeni. O nome da banda quer dizer ``máquina do tempo". E foi em russo, desculpando-se pelas três décadas de cortinas fechadas, que a banda interpretou reggaes, baladas, rocks e charlestons do século 12. Só faltou baião soviético.
Mas não foi desta vez que os russos invadiram os EUA.

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