São Paulo, segunda-feira, 24 de julho de 1995
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Câmbio e estatísticas

LUÍS NASSIF

A dificuldade do país em dispor de estatísticas confiáveis só não é mais espantosa que a facilidade com que economistas e jornalistas recorrem às estatísticas, como se fossem manifestações intocáveis da realidade.
No plano cambial, por exemplo, ninguém em sã consciência tem condições de prever corretamente o futuro.
Na parte negativa, há dois movimentos na balança comercial que, se ampliados, serão glicerina pura mais adiante. Do lado das exportações, os pré-pagamentos e os Adiantamentos de Contratos de Câmbio (ACC) correspondiam a 10% do volume de exportações do país no ano passado.
Este ano, a tendência é aumentar. Significa que parte das exportações futuras não implicará mais em entrada de divisas -que já ingressaram antecipadamente.
Do lado das importações, há um volume significativo de financiamentos, que significarão desembolsos já contratados nos próximos meses, independentemente da redução da atividade econômica.
Na parte positiva, há a redução das importações de automóveis e combustíveis, permitindo sonhar-se com o equilíbrio comercial até o final do ano. Só que às custas de jogar a atividade econômica em um nível bastante baixo.
Ou seja, no balanço financeiro, os dados atuais são positivos -mas lançam dúvidas pesadas para o futuro. Do lado comercial, os dados atuais são negativos, mas acenam com perspectivas de melhoria no médio prazo.

Câmbio de importação
Uma das distorções provocadas por essas taxas de juros estratosféricas ocorre em relação ao câmbio para o importador. Confira:
1) O importador importa a mercadoria com dólar a R$ 0,92 e com seis meses de prazo para pagar.
2) Se vender a mercadoria no primeiro mês, aplicando no mercado financeiro obterá 26% de rentabilidade no período.
3) Mantido o ritmo atual de desvalorização cambial, mais 8% de juros ao ano, o custo financeiro do financiamento será de 17%.
4) Como consequência, o valor efetivo do câmbio de importação foi de R$ 0,85.
5) Em financiamentos de 12 meses, o câmbio efetivo cairá para meros R$ 0,79.

Banco do Brasil
Na semana passada, a coluna demonstrou que as regras fixadas pelo Banco do Brasil para renegociação da dívida não permitiriam sequer uma renegociação em todo território nacional.
Na semana passada, o BB agregou uma nova condição, que obriga o mutuário a pagar mais 18% de IOF sobre o total refinanciado. Com os demais encargos definidos pelo banco, para cada R$ 1.000,00 de dívida o mutuário pode refinanciar R$ 800,00, desde que disponha de R$ 600,00 adicionais para pagar à vista.

Deus e o diabo
No ano passado, naqueles jogos de toma-lá-dá-cá que marcam a mídia, o então diretor da área internacional do Banco Central Gustavo Franco passou informações à imprensa, e foi tratado como gênio e principal mentor do plano.
Agora, sob fogo cruzado devido à política cambial implementada -e fora do centro dinâmico de informações-, é visto como megalômano, devido ao lançamento de seu livro sobre o Real.
Nem tanto ao céu, nem tanto ao mar. Franco é intelectual de peso e há muitos anos considerado o maior estudioso nacional da história das hiperinflações mundiais.

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