São Paulo, segunda-feira, 24 de julho de 1995
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As garotas britânicas salvam a pátria do rock atual

ANDRÉ FORASTIERI
ESPECIAL PARA A FOLHA

Relembrando as clássicas palavras de Roger Moreira, ``eu gosto é de mulher". Faço parte desta maioria cada vez mais oprimida, a dos heterossexuais brancos e fumantes.
Em breve só restará a nós nos unirmos e sairmos em passeatas pelas ruas, berrando ``a saída é a luta armada".
O problema é gostar de mulher nas artes. Reparei nisso um tempo atrás, olhando os livros que se empilham pela sala (quarto, banheiro etc.) de casa. Só tem livro escrito por homem em casa. Tirando a Mary McCarthy e a Lilian Hellmann, mas elas também não contam muito -as duas tinham ``cojones".
Encasquetado, fui bispar os CDs que se reproduzem como roedores pela sala (quarto etc.) Mesma coisa! Quase só tem homem cantando de galo na minha casa.
É uma coisa triste a respeito do rock atual: até as mulheres cantam como homens. Hole, Babes In Toyland, L7, todo o rock americano está infestado de histéricas gritalhonas.
Um amigo ligeiramente mais machista que eu resumiu assim a questão das ``riot grrrls": ``é falta de macho". Aliás, parecem cheirar como homens também. Lembro da Courtney Love no Hollywood Rock -rescendia a vestiário de colégio. A mulher parecia não ter tomado um banho desde 1987.
Outro amigo, que ama vozes femininas sobre guitarras, tentou me converter às Julianas Hatfield da vida. Não dá. Rockzinho ensimesmado universitário só funciona com gay cantando -e mesmo assim eu não engulo.
A salvação, recente e inesperada, é o rock inglês. Enquanto nos EUA as mulheres ou berram ou se lamentam, na Grã-Bretanha as mocinhas têm se mostrado bem talentosas, agradáveis e, bem, femininas. Mesmo PJ Harvey, que berra e se lamenta simultaneamente, escapa da vala comum.
Dessa safra, as duas bandas mais adoráveis são o Elastica e o Shampoo. O primeiro, ninguém entendeu, e o segundo, ninguém nem fez força para entender.
O Elastica foi mundialmente malhado por fazer new wave igualzinho como Stranglers, Wire, Au Pairs etc. faziam há quinze anos. Bom, e daí? Ramones, Stones e quase todo mundo que vale a pena fazem sempre a mesma coisa e ninguém mete o pau. Prince sempre viveu de regurgitar a música negra do passado, o que não impediu todos esses críticos tontos de achar o cara genial. Fora que a cantora do Elastica, Justine, é um tesão.
Prediletas da casa número dois: Shampoo. Para começar, é o melhor disco novo que eu ouvi este ano e uma das melhores estréias de todos os tempos. Não faço idéia de quem seja o gênio por trás das meninas -deve ter um Phil Spector nos bastidores.
O que interessa é que o disco é uma maravilha curativa. Lindo, leve, saltitante, agressivo e dançável, Sigue Sigue Sputnik-B'52's-Runaways-Pizzicato Five, tudo em um CDzinho.
Outro amigo (sei, esta coluna está cheia de amigos; fazer o quê, é tudo jornalista, alguns da concorrência, e jornalista citar jornalista é meio chato) entrevistou as meninas do Shampoo e dizem que elas não são nada daquilo. Assim, dá para encarar, mas debaixo do pancake se escondem aquelas peles podres de inglês.
Tudo bem, tudo bem. O que interessa, uma vez na vida, é o som. E o clip de ``Trouble" com participação especial dos Power Rangers!

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