São Paulo, segunda-feira, 31 de julho de 1995
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Andrade economizam pela TV

HUMBERTO SACCOMANDI
DO ENVIADO A RIBEIRÃO PRETO

A final do Campeonato Paulista pouco alterou a rotina do distrito de trabalhadores rurais de Cruz das Posses, onde vive dona Marta Luiza do Amaral de Andrade, 46.
Ela recebeu a reportagem da Folha no primeiro tempo da decisão de ontem.
Apesar de estar a apenas 30 km do estádio Santa Cruz, uma grande distância social separa esse povoado pobre da rica e urbana Ribeirão Preto.
``Se eu e meus dois filhos fôssemos ver o jogo, não sobraria dinheiro para as compras do mês", disse dona Marta.
O ingresso mais barato ontem, arquibancada, custava R$ 15. O mais caro, numerada, R$ 50.
Natural de Ituverava, ela trabalhou nas lavouras da região desde os 10 anos. Por 25 anos, cortou cana-de-açúcar.
Hoje, dona Marta vive do salário de dois filhos que moram com ela, o que dá cerca de R$ 500 por mês.
Ela ainda não tem direito a aposentadoria, apesar de ter trabalhado por cerca de 30 anos.
Dona Marta quase não assiste futebol e não torce para nenhum time.
Mas seu genro, o paranaense Alício da Silva, 27, também trabalhador rural, é corintiano.
Politizada, dona Marta colabora no sindicato da categoria em Sertãozinho.
Hoje acha que o sindicato anda muito ``frouxo" com os patrões. A casa onde vive pertence ao sindicato.
Foi nessa casa simples, de três cômodos, sem forro, que ela assistiu o primeiro tempo da final do Paulista com a Folha, juntamente com Alício, seu filho Cláudio, a filha Maria Helena e Robert, seu terceiro neto.
(HuSa)

Folha - A sua família inteira trabalha no campo?
Marta - Sim. Meus pais trabalhavam, eu trabalhei, meus filhos e filhas ainda trabalham.
Folha - Quanta cana a sra. conseguia cortar?
Marta - Não me lembro, mas não muita. Eu tinha problema na coluna e o médico disse que não podia forçar. Assim, não dava pra ganhar muito.
Folha - Era muito duro o trabalho na sua época?
Marta - Sim, mas quando eu era solteira não ligava. Era até divertido na roça. Depois me casei e tive quatro filhos.
Aí o casamento não deu certo e tive de trabalhar muito para criar as crianças.
Folha - A sra. acompanha futebol?
Marta - Só jogo de seleção brasileira. Mas meus filhos ficam nervosos porque eu não entendo e pergunto muito, e me mandam embora da sala.
Folha - A senhora já trabalhou na usina dos Balbos. Como são ele como patrões?
Marta - Patrão nenhum é muito bom, mas o Balbo é muito correto. Dos usineiros por aqui, é quem paga melhor, e paga em dia.
Ele é muito organizado e a usina é bastante limpa.
Folha - Você, Alício, sempre torceu para o Corinthians?
Alício - No Paraná, não. Quando cheguei aqui, fiquei conhecendo melhor o time e gostei.
Folha - Quem vai ser campeão?
Alício - O Corinthians, claro. Mas eu queria que o time arrebentasse, só que é o Palmeiras que está jogando melhor.
Marta - Ah, não sei não. Não gosto quando um time perde. Eu fico com pena.

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