São Paulo, quarta-feira, 2 de agosto de 1995
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Museu em Viena traz tela inédita de Klimt

LUÍS ANTÔNIO GIRON
ENVIADO ESPECIAL A VIENA

A mais importante e numerosa coleção de telas do pintor austríaco Gustav Klimt (1862-1918) acaba de ser reaberta ao público. As 33 telas pertences à Galeria Austríaca do Belvedere em Viena serão expostas até o fim de agosto. Depois, passarão por um processo de limpeza e restauração.
A atração da mostra é uma obra recém-descoberta do pintor, o óleo sobre cartão ``Velho no Leito de Morte", realizado em 1900. O Belvedere comprou a obra de um colecionador particular austríaco e a está exibindo ao público pela primeira vez.
A pintura integra a série de estudos preparatórios para os quadros alegóricos ``Filosofia", ``Medicina" e ``Lei", realizados em 1901 para decorar o salão de festas da Universidade de Viena.
``Velho no Leito de Morte" ganha ainda mais importância porque essas três obras foram destruídas em 1945 no final da Segunda Guerra, quando, contam os vienenses, os alemães bateram em retirada sem antes deixar de destruir alguns dos monumentos artísticos da cidade, como a universidade e o Burgtheater.
``Velho no Leito de Morte" teve dois esboços anteriores que sobreviveram à tragédia. Datam de 1894, quando Klimt recebeu a encomenda da universidade. ``O que mais chama atenção no quadro é a espantosa riqueza de variedades de tons de branco", comenta o curador da exposição do Belvedere, o crítico Gerbert Frodl.
Os visitantes se aglomeram diante do quadro lúgubre e branco como se fosse a ``Mona Lisa".
Klimt se tornou nos últimos 30 anos um nome consagrado pela massa. Hoje na Europa seus personagens são tão populares quanto os do francês Toulouse-Lautrec. As ``salomés" art nouveau do artista, tão fatais quanto decorativas, inspiraram o design de todo tipo de produto, até um perfume Klimt. Pôsteres com ``O Beijo", óleo, prata e ouro sobre tela de 1908, e ``O Chapéu Violeta", óleo de 1909, são vendidos em toda parte.
A grande retrospectiva klimtiana em Zurique há três anos foi o tiro de misericórdia no resto de intangibilidade que Klimt tinha. As obras viajaram tanto que agora precisam descansar. ``Muitas paisagens e retratos estão com as cores esmaecidas, devido à excessiva exposição à luz", diz Frodl.
Uma das telas já foi restaurada e a diferença entre antes e depois é gritante. É justamente ``Chapéu Violeta". Antes, destacava-se o olhar oblíquo da moça ruiva atrás de um cachecol negro quase inexistente, uma mancha negra que se projetava para o fundo também negro.
Com a restauração, a cor negra do cachecol ganha um brilho acetinado e se projeta para a frente da tela, fazendo um dueto com o cabelo e os olhos da moça. A cor violeta do chapéu assumiu aspecto ultravioleta. O fundo, antes apagado, teve recobradas as luzes amarelas e vermelhas criadas por pinceladas nervosas e abstratas.
Fica evidente a intenção de Klimt de objetualizar os modelos. Fundador do movimento da Secessão vienense em 1897, ao lado dos artistas Carlo Moll e Josef Hoffmann, o pintor se preocupou em sintonizar os artistas de seu país com os movimentos de vanguarda da Europa Ocidental.
Até Klimt, a pintura austríaca era considerada provinciana e seu único traço distintivo era o estilo ``biedermeier", que retratava a pequena burguesia em atividades cotidianas no início do século 19.
Klimt negou a perspectiva tradicional pelo decorativismo, o luxo oriental e a ousadia sexual. Suas mulheres mostram tudo. Surgia o modernismo em Viena, em paralelo com a revolução freudiana e o pensamento de Wittgenstein.
A discussão já começou em relação ao ``Velho no Leito de Morte". Alguns apostam na vontade de chocar do pintor. Outros, na estetização da morte. A verdade é que Klimt se fascinava por objetos inanimados. De certa maneira, todos os seus modelos recendem a mortandade.

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