São Paulo, quinta-feira, 3 de agosto de 1995
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Feiúra não é desgraça. Beleza é.

MOACYR SCLIAR

Logo depois de ganhar o concurso da Mulher mais Feia, Maria Basculho embarcou na bicicleta que tinha ganho de prêmio e rumou para casa. Pedalava com dificuldade, porque o pneu traseiro estava furado (sendo prêmio de concurso de feúra, o que se podia esperar?), mas ia contente: o marido vibraria com o título que conquistara. Afinal, fora ele quem a estimulara a concorrer -a vitória era uma homenagem à sua visão. Além disso, os R$ 200,00 que recebera do prefeito era uma boa ajuda para o orçamento familiar. Isso sem falar na bicicleta propriamente dita: agora a família tinha um meio de transporte.
Ia, portanto, a Maria Basculho muito contente, quando de repente levou um susto: na estrada, à sua frente, estava um sapo. Tentou parar, não conseguiu -a bicicleta não tinha freio-, e para salvar o pobre bicho, não teve outro jeito senão sair da estrada. Na precipitada manobra, caiu machucando o braço. Mas, pelo menos o sapo tinha escapado: continuava ali, imóvel, olhando-a. Maria Basculho montou na bicicleta e já ia embora, quando ouviu uma voz grossa:
-Obrigado, comadre. A senhora é boa gente.
Era o sapo. Maria Basculho já tinha ouvido muitas histórias sobre sapos que falam, mas era a primeira vez que encontrava um deles -e, sobretudo, era a primeira vez que era elogiada por um batráquio. Ficou muito admirada e, claro, muito contente.
-Que é isso, compadre sapo? Não fiz mais que a minha obrigação. Então eu ia passar em cima do senhor, um sapinho tão simpático? Deus me livre e guarde. Mas me diga uma coisa: onde é que o senhor aprendeu a falar como gente, compadre sapo?
-Se eu lhe contar um segredo, comadre, a senhora não espalha? Promete? Bom, então lá vai: eu não sou um sapo, sou um príncipe, sabe? Um príncipe encantado.
Ela estava maravilhada;
-Um príncipe encantado? O senhor, compadre Sapo? Quer dizer que, se eu o beijar, o senhor vira príncipe?
O sapo hesitou:
-Bem...Sim, eu viro príncipe, mas não precisa tentar. Aqui passa tanta moça, sabe...
-Mas, em compensação, vou fazer uma coisa pela senhora, comadre. Vou lhe transformar na moça mais linda desta região.
Um clarão, um estrondo -e, de fato, ela estava transformada numa moça líndissima.
Foi embora, resmungando. Como é que ia ganhar outro concurso de Mulher mais Feia? Aquele sapo não tinha mesmo o que fazer. Ela deveria ter passado por cima dele.

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