São Paulo, quarta-feira, 9 de agosto de 1995
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Compulsório (de esquerda)

ANTONIO DELFIM NETO

Antonio Delfim Netto
Os anos 70 e 80 mostraram aos países industrializados que o custo da desinflação é muito alto em termos de perda de Produto Interno Bruto e emprego e que, portanto, não há espaço para qualquer acomodação com a inflação. E mostraram, também, que no longo prazo ela não garante nem o pleno emprego nem a plena utilização da capacidade instalada. No curto prazo, variações inesperadas da taxa de inflação podem estimular o nível de atividade. Mas, da mesma forma que um organismo infectado e resistente, ele precisa de doses cada vez maiores do remédio para manter-se.
À medida que a inflação necessária se eleva, ela começa a produzir efeitos colaterais: o sistema de preços relativos deixa de funcionar, a intermediação financeira entra em colapso e piora a distribuição de renda. A tentação de aumentar o nível de atividade pela sistemática ampliação da demanda levou à sua erosão e carregou com ela o keynesianismo vulgar que a informava. Hoje o horror à inflação é tão grande que nem mesmo 35 milhões de desempregados são capazes de levar os governos à utilização de políticas monetária e fiscal expansionistas. Não apenas pelo desequilíbrio cambial que produziriam, mas porque eles têm consciência de que mais dia menos dia seriam obrigados à volta ao equilíbrio com custos sociais extremamente elevados. Esmagados pelo desemprego, os países voltam-se para uma política de oferta, flexibilizando o seu mercado de trabalho, introduzindo programas de treinamento, reduzindo os impostos sobre a mão-de-obra e sobre as empresas, aumentando a mobilidade dos fatores e assim por diante.
Nesse quadro se destaca uma ampliação do estímulo à competição dentro do setor financeiro, diminuindo sua tributação e permitindo a criação de toda sorte de novos produtos para reduzir os riscos. O que se pretende é manter a taxa de juro real no mais baixo nível possível (hoje entre 1% e 3% ao ano). Nesse campo a maior inovação tem sido a sistemática redução dos depósitos compulsórios dos bancos como instrumento de controle da oferta monetária. O depósito compulsório é uma forma de tributação que aumenta o custo do dinheiro e sua redução contribui para a queda das taxas de juros. A Nova Zelândia, o Canadá, a Austrália e a Suíça já reduziram a zero o compulsório sobre depósitos à vista. E os EUA e Alemanha, para 10% e 5% respectivamente.
Não há nenhum mistério no fato de que se pode controlar a oferta monetária dispensando os depósitos compulsórios, que têm hoje o papel de reduzir as flutuações do juro do ``overnight". Com a variação das reservas bancárias através das operações de mercado aberto, os bancos centrais podem manter sob controle a oferta monetária e, portanto, a taxa de juro definida pela demanda.
Quando se observa esse desenvolvimento e o comportamento da nossa política monetária, podemos entender a falta de inteligência das recentes medidas de compulsório sobre os fundos. Em lugar de reconhecer que a ampliação dos prazos é consequência da credibilidade da política, tenta-se impô-la pelo aumento dos custos! É positivamente uma política ``de esquerda", como diria o sr. presidente.

Antonio Delfim Netto escreve às quartas-feiras nesta coluna.

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