São Paulo, quinta-feira, 17 de agosto de 1995
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A indústria bancária no 1º semestre

ROBERTO TEIXEIRA DA COSTA

Não obstante o sucesso do plano de estabilização no primeiro semestre do corrente ano, provocando a quase total eliminação dos ganhos inflacionários que os bancos por décadas auferiram, a rentabilidade da indústria manteve-se significativamente alta no período em tela. Os seguintes fatores contribuíram para tal desempenho:
1) Com o enorme recolhimento de depósitos compulsórios junto à autoridade monetária, a oferta de crédito ficou tão escassa que os ``spreads" aumentaram sobremaneira, compensando em muito o efeito restritivo que as medidas contracionistas tiveram sobre o crescimento das operações ativas;
2) Muito embora a volatilidade das taxas de juro, da própria inflação e da variação cambial entre dólar e real tenham caído significativamente, os bancos ainda encontraram situações propícias para ganhos nas operações de tesouraria.
No que concerne aos bancos atacadistas, a arbitragem dólar/real ainda propiciou lucros expressivos. Boa parte dos ganhos desta arbitragem foi contabilizada no exterior, nas subsidiárias ou agências sediadas em paraísos fiscais, o que tornou tais lucros isentos de tributação brasileira;
3) Mesmo afetada pelas medidas de contração adotadas pelo governo, a expansão do consumo no segundo semestre de 1994 e primeiro de 1995 gerou importantes ativos na área de ``crédito ao consumidor" que foram importantes contribuições para muitos grupos financeiros;
4) A maior parte dos conglomerados financeiros utilizou as operações de leasing para: a) aumentar suas operações de crédito e b) contornar os altos níveis de recolhimento compulsório. Tal prática fez com que as empresas de leasing reportassem grandes crescimentos em suas operações ativas e na rentabilidade operacional, o que, por equivalência patrimonial, refletiu-se no resultado dos bancos múltiplos controladores.
Durante o semestre, foram realizados emissões expressivas de debêntures de companhias de leasing, que se constituíram nas principais operações de ``underwriting" do período, viabilizando o ``funding" dessas empresas;
5) Outro aspecto a ser ressaltado foi a gradual reabertura do mercado de capitais internacional para emissões de bancos brasileiros; após os três primeiros meses do ano, nos quais os efeitos das crises mexicana e argentina praticamente inviabilizaram colocações de títulos brasileiros no euromercado. No segundo trimestre observou-se uma lenta retomada das captações; isto favoreceu sobremaneira o sistema financeiro, que tem nessas colocações a única fonte de médio prazo.
6) A indústria de fundos de investimento, mormente aqueles voltados para proteção do dinheiro dos efeitos inflacionários (principalmente os fundos de commodities) apresentou expressivo crescimento, gerando fortes receitas de taxas de administração para os conglomerados financeiros, principalmente aqueles de características varejistas, dotados de grande número de agências.
Os próprios bancos direcionaram grande parte dos recursos de seus clientes para tais fundos, objetivando contornar a necessidade de recolher compulsórios sobre os depósitos.
Dignos de registro, foram ainda:
1) No mercado de capitais doméstico, fora as operações já mencionadas, envolvendo debêntures de empresas de arrendamento mercantil, o mercado primário de ações e debêntures foi muito pouco ativo, não gerando, portanto, receitas muito expressivas para os bancos.
Diversas operações de grande porte, envolvendo enormes ``global offers" de ações, que seriam feitas aqui e no exterior, foram adiadas em função da situação dos mercados acionários latino-americanos;
2) A receita decorrente de prestação de serviços, exceto as geradas por fundos de investimento, não demonstraram um crescimento significativo no semestre em tela, em virtude da acirrada competição entre os bancos; e
3) O grande fator negativo do período, que contribuiu para reduzir os lucros, foi a necessidade de fortes provisionamentos para fazer frente aos créditos duvidosos.
Assim como ocorreu em 1987, ano subsequente ao do Plano Cruzado, em 1995 a grande maioria dos conglomerados viu crescer sobremaneira a inadimplência dos devedores. Na esteira dos grandes crescimentos verificados nas carteiras de empréstimos em 1994, no corrente exercício registrou-se um nível recorde de número de concordatas.
Notou-se um avanço importante no que concerne ao chamado índice de eficiência dos bancos, que traduz a relação entre despesas operacionais (de pessoal e administrativas) e a receita de intermediação financeira, taxas e comissões sobre serviços.
Ano a ano, os grupos financeiros brasileiros vêm mostrando avanços na produtividade, embora ainda estejam atrás de seus congêneres dos países desenvolvidos.
Vale ainda mencionar que o nível de alavancagem dos bancos brasileiros é baixo, comparativamente aos padrões do exterior. Essa média no exterior é de dez a 15 vezes o patrimônio líquido, enquanto no Brasil, o total de créditos sobre os recursos não exigíveis, em geral, não ultrapassa sete vezes.
Mesmo tendo aumentado, os ativos não performantes sobre o total dos ativos não chegaram a comprometer a saúde do sistema financeiro, representando um percentual mais reduzido do que os observados em outros países emergentes em que tivemos sobressaltos no sistema financeiro.
De qualquer forma, a manutenção de taxas de juros elevadas, com decréscimo da atividade econômica, poderá causar uma deterioração desse quadro. Estamos convencidos que nossas autoridades monetárias estão atentas e têm os instrumentos para manter sob controle a saúde do sistema.

Colaborou LUIS SPÍNOLA, diretor da Brasilpar

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