São Paulo, terça-feira, 22 de agosto de 1995
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Velhos baianos

LUÍS PAULO ROSENBERG

A primeira semana após a intervenção no Econômico foi forte em emoções, rica em idas e vindas. Amadorismo e interesses menores se uniram para arranhar a credibilidade de quase todas as instituições da República. Houve até um bufão que, ao comparecer ao Banco Central, entregando uma nota de R$ 1 e dizendo ``vim comprar o meu banco", ouviu, perplexo, do funcionário de plantão: ``E quedê o carro da Brink's, com os R$ 2 bilhões restantes?"
De positivo, o episódio demonstrou que o brasileiro, com sua capacidade de indignação recém-adquirida, não admite a repetição do episódio da estatização do Sul Brasileiro, no qual todos pagaram pelos desacertos de poucos, para evitar o sofrimento de alguns.
Hoje, sabemos que é preciso mais do que um vice-reizinho regional e um primeiro mandatário frouxo para forçar a viúva a pagar a conta do butim. Fato memorável, belíssima jurisprudência para Banespa e Banerj, mas pouco para darmos por encerrada a crise do Econômico: provavelmente, o que vimos até agora é apenas o finzinho do bom, o ruim está por chegar...
De fato, as consequências da intervenção poderão ocorrer em vários níveis, pois são enormes os choques de interesses que o potencial de perdas engendra, difíceis de serem administrados por burocratas menos amadurecidos.
Em primeiro lugar, ``solução de mercado", entendida como algum grupo adquirindo ativos e passivos do Econômico, sem ônus para o BC, podemos esquecer. Afinal, todo o Q.I. da Bahia esteve mobilizado nessa direção, nos últimos meses, sem chegar a lugar algum.
A cada dia que passa, mais longa será a fila de baianos ansiosos por sacar tudo que têm no Econômico, independente da pseudo-solução alta que se venha a encontrar. Portanto, a primeira bifurcação indigesta que teremos pela frente é esta: ou o governo federal, que não tem nem para o Jatene, bota muito para arder nessa fogueira, ou o banco será liquidado.
Uma particularidade, na opção por colocar recursos federais, é a questão dos compromissos externos do Econômico: o BC deve pagar nos vencimentos, zelando pela imagem do Brasil, ou canalizar recursos prioritariamente para acudir o depositante nacional?
Pessoalmente, preferiria deixar quebrar lá fora, por duas razões. A primeira é que o Econômico pagava taxas mais elevadas do que qualquer outro banco nacional para captar recursos no Exterior, sinalizando que fazia uma opção pela aventura quem aplicava num banco com a pior avaliação de risco existente. Em segundo lugar porque, certamente, o grosso dos investidores em papéis estrangeiros do Econômico é de brasileiros mesmo, cujos recursos chegaram lá só os orixás sabem por quais caminhos tortuosos.
De qualquer forma, o investidor internacional sabe que quem está na chuva é para se molhar: se não havia garantia do governo, um título do Econômico não honrado pelos interventores não afeta a imagem do Brasil.
Mais importante para que a comunidade internacional avalie nossa seriedade é investigar a fundo dois tipos de irregularidades: o que foi a bandalheira dos controladores do banco até se chegar ao colapso e a lista de Schindler dos clientes brasileiros no exterior, provavelmente a fina nata dos sonegadores de impostos e violadores de vários preceitos legais.
As repercussões para fora do banco são também preocupantes. Poucos recursos do sistema financeiro ficaram presos na morte previamente anunciada do banco. Isso é positivo, pois o Econômico não estará dando, diretamente, o abraço do afogado em nenhum banco.
Mas o decorrente excesso de cautela dos poupadores, transferindo suas aplicações para os grandes bancos nacionais e estrangeiros, complica a vida de bancos com problemas de liquidez. Ademais, ções da República. Houve até um bem esses recursos temem repassá-los aos que caíram na boca do povo, criando o fenômeno definido por Dirceu Bezerra como ``empoçamento"; concentração da liquidez em poucos bancos, sem repasse para os necessitados, que minguam em meio à abundância.
Finalmente, é inegável que o Econômico era o principal banco da Bahia. Consequentemente, as perdas que a classe empresarial baiana vai sofrer serão punitivas, capazes de jogar o Estado numa situação de inadimplência e desemprego generalizados.
Uma pauta cheia de sustos, sofrimentos e desilusões pela frente, portanto. O que menos se precisa quando se tem um programa de estabilização em fase de consolidação.

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