São Paulo, terça-feira, 22 de agosto de 1995
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Esoterismo inunda narrativa

PEDRO ALEXANDRE SANCHES
DA REDAÇÃO

Parece o próprio paraíso na Terra o almanaque de Baby Consuelo, ops, do Brasil. Em 846 quilômetros e 202 páginas, ela só faz transbordar de felicidade, receber lições de vida, chorar de emoção e comemorar até dificuldades como coxas distendidas. Logo de início, Baby vive um dilema: deve ser cósmica ou telúrica?
Traduzindo: deve ser mais ar ou mais terra? Traduzindo mais ainda: deve continuar espiritual como diz ser por natureza ou se apegar à matéria, cuidando do cansaço incontrolável e das bolhas que estouram em seus pés?
Nós, que pensávamos que Baby fosse a um só tempo cósmica e telúrica, nos surpreendemos com o dilema. Quase suspeitamos que ela seja, na verdade, barbitúrica.
As dúvidas não duram muito, claro, e logo Baby está novamente admirada com a sincronicidade do universo, que conspira a nosso favor em qualquer circunstância.
A neoescritora conspira, assim, com a corrente filosófico-literária de Paulo Coelho. Ainda que, como afirma, não tenha aprendido com ele o caminho de Santiago, uma coisa é certa: aprendeu, com o mago, o caminho da mina de ouro de um filão de público esotérico e ávido por ensinamentos e psicologia de almanaque.
Se vai funcionar, são outros quinhentos, mas, esperta que é, Baby se garante pelas tabelas. Fofoqueira, não deixa de revelar detalhes picantes de seu rompimento com Pepeu Gomes, ex-marido e parceiro.
Sutil, Baby admite, com muito carinho, que foi ela quem deu um pontapé no pai de todos aqueles filhos de nome esquisito e que o mesmo reluta em soltar a grana das crianças.
Mais: Pepeu andou brecando sua carreira musical, iniciada junto aos geniais Novos Baianos nos anos 60. Mas ela mesma admite boa parcela de culpa no negócio.
É aí, e não na enchente de esoterismo que incha o tal ``Peregrina", que Baby abre o jogo: a cantora se perdeu no furor da mística.
E o Brasil perdeu uma roqueira-sambista de estirpe, criadora vocal de clássicos como o dueto com Ademilde Fonseca em ``Apanhei-te Cavaquinho", o choro ``Brasileirinho", de Waldir Azevedo, e a festa de ``A Menina Dança" dos Novos Baianos.
A nós, agora empapuçados das nuvens de esoterismo de ``Peregrina", resta-nos esperar por Baby do Brasil, a cantora, renascida nos pedregulhos de Santiago.

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