São Paulo, sexta-feira, 25 de agosto de 1995
Texto Anterior | Próximo Texto | Índice

Documentário mostra Glauber enfurecido

Cineasta co-dirigiu "As Armas e o Povo" em 1974

PEDRO ALEXANDRE SANCHES
DA REDAÇÃO

Em exibição hoje, em duas sessões, o filme ``As Armas e o Povo", inédito no Brasil, é curiosidade histórica para portugueses e brasileiros, por razões diversas.
Para portugueses, porque documenta nas ruas a revolução que, em 25 de abril de 1974, derrubou o regime fascista iniciado nos anos 20 por Antonio Salazar. Para brasileiros porque, entre os 28 diretores do filme (realizado pelo sindicato dos trabalhadores locais de cinema), destaca-se Glauber Rocha, figura de proa do Cinema Novo.
No filme, mais marcante até que o vigor de cineasta de Glauber é sua presença na frente das câmeras, como entrevistador.
Renovador do cinema nos anos 60 com filmes como ``Deus e o Diabo na Terra do Sol" (64) e ``Terra em Transe" (67), Glauber passou parte dos anos 70 rastreando movimentos populares pela Europa e África -e fazendo filmes sobre o assunto.
Glauber se revela enfurecidamente entusiasmado diante da revolução portuguesa. Embrenha-se por bairros pobres e centra suas entrevistas em figuras populares.
Sua personalidade contraditória se revela a cada pergunta. Fica sempre atrás do entrevistado, como ideólogo a manipular um fantoche. Dispara perguntas como balas de metralhadora, interrompe respostas, bate nos ombros do entrevistado. Intimida, por vezes, como faz com a mulher que diz que não irá à passeata. A rajada de perguntas é recheada de argumentos de condenação à mulher.
Usa, em síntese, estratégias bem semelhantes às técnicas de intimidação e tortura dos ditadores, só que verbalmente. É seu diálogo com o sistema que combate.
O filme, em seu todo, abusa do tom panfletário, como era inevitável no ardor da época. Como brecha, a montagem privilegia o ridículo dos revolucionários -Mario Soares em especial-, alternando sua verborragia de palanque com imagens de entrevista (sem som) de um velho pobre e estropiado -o povo continuava sem voz.
E, note-se, com imagens em panorâmica do oceano português, intervenção evidente de Glauber. Revolto e bravio em ``Deus e o Diabo" e ``Terra em Transe", o mar agora é plácido, brilhante. A revolução estava consumada.

Filme: As Armas e o Povo
Quando: hoje, às 21h30 e às 23h
Onde: Espaço Banco Nacional (r. Augusta, 1.475, tel. 011/288-6780)

Texto Anterior: Coluna Joyce Pascowitch
Próximo Texto: Guerreiro não desanima nunca
Índice


Clique aqui para deixar comentários e sugestões para o ombudsman.


Copyright Empresa Folha da Manhã S/A. Todos os direitos reservados. É proibida a reprodução do conteúdo desta página em qualquer meio de comunicação, eletrônico ou impresso, sem autorização escrita da Folhapress.