São Paulo, domingo, 27 de agosto de 1995
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Conferência da ONU em Pequim revela situação da mulher chinesa

JAIME SPITZCOVSKY
DE PEQUIM

A 4ª Conferência Mundial da Mulher, de 4 a 15 de setembro, vai receber delegações de 185 países para discutir problemas globais, mas acabará jogando mais luz sobre a discriminação enfrentada pelas chinesas, por elas serem as anfitriãs do evento.
O controle da natalidade, o aborto de fetos femininos na busca de um filho, a "venda" de mulheres para prostituição, os casamentos forçados e a desigualdade no trabalho são algumas das agressões às mulheres chinesas.
A Conferência Mundial da Mulher, que reúne delegações oficiais, representa o maior encontro já promovido pela ONU até hoje.
Paralelamente ao evento, de 30 de agosto a 8 de setembro, ocorre a reunião de organizações não-governamentais (ONGs) dedicadas aos problemas da mulher.
Pelo menos 35 mil pessoas devem chegar a Pequim para participar das duas reuniões.
A expectativa inicial era de pelo menos 40 mil pessoas. Mas a falta de organização dos chineses para emitir os vistos de entrada no país e a tentativa de Pequim de barrar a entrada de adversários do regime comunista indica que a participação pode baixar.
Também se especula que a China procure diminuir a "invasão", pois não teria total capacidade de acomodação em Huairou, distrito de Pequim a 55 km do centro, sede do encontro das ONGs.
Trata-se do maior encontro internacional já realizado em solo chinês. O governo desejou promovê-lo para mostrar que o país tem condições de organizar eventos de grande porte, como uma Olimpíada, seu objetivo maior.
Mas agora as autoridades chinesas, que limitam a liberdade de expressão, temem protestos pró-democracia de grupos de mulheres.
Um documento interno do Ministério de Segurança Pública qualifica a Conferência como ``o maior desafio enfrentado pelo sistema de segurança pública do governo comunista chinês em mais de 40 anos".
Antes mesmo do início da reunião da ONU, já houve um incidente, em 15 de agosto. Seis integrantes do Greenpeace ergueram uma faixa na praça Tiananmen para expressar sua oposição a testes nucleares.
A polícia os prendeu imediatamente, juntamente com os jornalistas que haviam fotografado a cena. Isso revela o quanto o governo chinês está precavido, em guarda.
Outro tema de eventuais manifestações feministas pode ser a situação da mulher na China.
O país, o mais populoso do mundo, com 1,2 bilhão de habitantes, aplica uma política de natalidade conhecida como "um casal, um filho.
Essa política obriga mulheres a abortar ou a se submeter a esterilização. Ela cria também o problema do aborto de fetos femininos, pois há famílias que, desejando ter um filho para manter o sobrenome ou ajudar no trabalho, procuram saber o sexo da criança ainda na gravidez. De 1º de junho em diante, passou a vigorar lei que proíbe os médicos chineses de revelar o sexo do feto.
Cifras oficiais mostram que há, na China, 118,5 homens para cada 100 mulheres, tendência que pode desaguar em sério desequilíbrio: 80 milhões de homens solteiros no começo do século 21.
A China também enfrenta o problema da "venda" de mulheres e meninas, que havia sido extinta pelos comunistas quando eles chegaram ao poder, em 1949.
Essa prática ocorre no interior do país. Os compradores buscam uma mulher para casamento ou para explorar com a prostituição.
Sobrevive, ainda, a velha tradição dos casamentos arranjados. Pesquisa feita em maio pela TV chinesa mostrou que apenas 47,6% das mulheres responderam que tinham "decidido" sozinhas com quem iam se casar. A pesquisa entrevistou 10.061 mulheres.
No trabalho, as mulheres chinesas também sofrem discriminação. "A formulação legal de que homens e mulheres são iguais ainda não foi completamente implementada", afirmou documento do governo chinês, lançado para a Conferência Mundial da Mulher.

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