São Paulo, terça-feira, 12 de setembro de 1995
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O modelo UnB

DIRCE MENDES DA FONSECA

O modelo de universidade está sendo rediscutido pelo atual governo, no contexto da reforma do Estado. Nessa discussão, vem à tona o modelo da Universidade de Brasília, criada em 1961, para dar apoio ao modelo de desenvolvimento auto-sustentado.
A identidade científica e acadêmica vinculava-se ao projeto nacional desenvolvimentista. Para tanto, impunha-se dar ênfase às instituições de pesquisa e à formação de técnicos capazes de investigar os problemas brasileiros.
A UnB foi criada sob a forma de fundação, com autonomia financeira-administrativa e constituída por um patrimônio capaz de proporcionar-lhe autonomia econômica.
O que fundamentou a concepção da UnB foi a associação ao Estado nacional-desenvolvimentista, representado pelo esforço dos acadêmicos engajados politicamente na tarefa de construção de uma sociedade autônoma em contraposição aos interesses iminentes do capital monopolista.
Os conteúdos políticos e éticos do atual governo se expressam na reforma do Estado, proposta pelo Ministério da Administração Federal. Nessa, indica-se a transformação de universidades federais públicas em organizações não-estatais de direito privado. Retomar a concepção da UnB para justificar sua adesão ao projeto do governo significa uma manobra ideológica.
A atual reforma do Estado e de seus aparelhos opõe-se radicalmente ao contexto do Estado nacional-desenvolvimentista e se insere na ótica da reorganização produtiva e dos aparelhos de hegemonia.
O mercado constitui-se protagonista das novas relações que impõem, entre outras, a concepção da ciência como força produtiva, formas mais flexíveis de uso da força de trabalho, negociação, incentivo ao privatismo em oposição ao público e redefinição das relações Estado-sociedade.
Dentre essas redefinições, as universidades agregam-se ao setor de serviços submetidas à lógica do mercado e da competitividade. O governo transfere para a universidade a tarefa de captar recursos para o desenvolvimento de suas atividades, via autonomia gerencial decorrente da opção pelo modelo privado.
Faz parte da estratégia do governo "escolher" uma universidade para a implantação do modelo que propõe transformar as universidades federais em organizações não-estatais de direito privado.
Acenar para a UnB com a possibilidade de ser "mentora" desse reaparelhamento pode se justificar por várias razões. O que não se justifica é buscar na sua origem a vocação às mudanças que o governo deseja implementar.
Assim, poder-se-ia justificar suas estrutura e vocação autônomas em função do esforço organizativo voltado aos interesses do desenvolvimento auto-sustentado. Tomar o modelo UnB desvinculado de sua identidade política e contexto histórico, é servir à novos interesses em nome dos velhos compromissos.

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