São Paulo, domingo, 17 de setembro de 1995
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Eleição de 89 fez CIA olhar para evangélicos

GILBERTO DIMENSTEIN
DE NOVA YORK

Erramos: 06/01/96
A sucessão presidencial de 1989 deu pela primeira vez aos evangélicos destacado espaço nos relatórios sobre o Brasil produzidos pela CIA (Agência Central de Inteligência), atenta à possibilidade de vitória de um presidente de esquerda. Foi examinada sua estrutura de poder, formada por milhões de votos, igrejas e redes de comunicação.
Nas análises destacava-se o papel da Igreja Universal do Reino de Deus, comandada pelo bispo Edir Macedo. A igreja que, pelo menos nos relatórios da CIA, comungava do mesmo projeto de Roberto Marinho, dono das Organizações Globo: evitar o milagre de um operário, sem curso superior, virar presidente no Brasil.
Os analistas políticos da Embaixada dos Estados Unidos no Brasil viam nos evangélicos uma ajuda valiosa para Fernando Collor, que, desde o início do segundo turno, foi perdendo pontos.
Numa campanha agressiva encabeçada pela Igreja Universal, Luiz Inácio Lula da Silva era apresentado nas missas, programas de rádio e evangélicos como a própria encarnação do mal.
O caso brasileiro não é exceção nos relatórios do governo norte-americano sobre as novas estruturas de poder no mundo.
Um dos novos fenômenos é a propagação dos pentecostais nas mais variadas regiões, compondo forças de poder com expressão política: da China, passando pela Coréia do Sul e Rússia, até o Brasil. Os estudos indicam que, a cada dia, eles ganham 50 mil fiéis.
Em nenhum continente, entretanto, cresce tão rapidamente como na América Latina, segundo os estudos produzidos pelas universidades americanas. E, na América Latina, em nenhum lugar como o Brasil, tido como o maior país católico do mundo. Daí porque a maioria das pesquisas faz abundantes referências ao fenômeno brasileiro.
O interesse nas universidades pelo pentecostalismo é recente. Os acadêmicos ligados à América Latina apostavam na evolução da Teologia da Libertação, mais tarde estrangulada pelo Vaticano.
No geral, os pentecostais eram vistos como fanáticos, exploradores da fé dos pobres, charlatões, prometendo milagres e curas.
"A moda era dizer que, no geral, a religião estava em franca decadência", afirma Harvey Cox, professor de teologia de Harvard.
Cox viajou por templos pentecostais de várias partes do mundo, da Coréia do Sul ao Brasil, para produzir um livro ("Línguas do Céu"), lançado no ano passado. O próprio Harvey serve como exemplo da mudança de ares no meio acadêmico.
Pela primeira, em 1991, a imponente faculdade de teologia de Harvard abriu um curso sobre o pentecostalismo, ministrado por Harvey.
O pentecostalismo ganhou status de objeto digno de estudo acadêmico depois de um polêmico livro do sociólogo David Martin, da London School of Economics, que, em 1991, chamado "Línguas de Fogo". Ele sustentava que, em breve, o pentecostalismo iria dominar toda a América Latina.
"A Igreja Católica brasileira fez a opção pelos pobres, mas os pobres optaram pelos pentecostais", ironiza Andrew Chesnut, pesquisa americano que estuda o movimento pentecostal no Brasil.
A explosão da igreja pentecostal está ligada ao crescimento das cidades e formação de massas urbanas deserdadas, traumatizadas com o corte de laços familiares como os migrantes e imigrantes.
Um sentido de disciplina, uma rede de solidariedade, testemunhos de sofrimento e, principalmente, a oferta de resolução dos problemas pelo milagre servem como poderosos atrativos -tudo amplificado pelos efeitos de marketing que, com habilidade, manipula a televisão.

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