São Paulo, segunda-feira, 18 de setembro de 1995
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Rodízio de carros: valeu?

SÉRGIO ANTONIO REZE

No contexto da acirrada batalha que hoje se trava nos grandes centros urbanos contra a poluição do ar, é de se esperar que qualquer medida tendente a reduzir o poder desse bárbaro agressor receba firme adesão da população.
Entretanto, o balanço do rodízio de veículos posto à prova em São Paulo parece indicar que, na prática, a adesão não ocorreu na proporção esperada por muitos, que, desde o dia seguinte à sua implantação, se dedicaram a apontar suas falhas.
Essa conclusão, porém, parece mais ter decorrido de uma expectativa exagerada que se formou em torno do projeto, não só por parte da população, mas das próprias autoridades que o lançaram.
No campo das competições esportivas, resultado positivo é tirar o primeiro lugar. O segundo lugar não tem brilho: tem sabor de eliminação.
Quando isso ocorre no futebol, ainda se pode procurar entender: afinal, somos ou não somos os melhores? Mas, quando se fala em controle ambiental, não se está cogitando nada parecido à reconhecida capacidade futebolística brasileira. Bem ao contrário, é um terreno em que estamos ainda engatinhando, no qual a vontade supera as possibilidades concretas.
Realisticamente falando, não podemos ainda ter a pretensão de tirar o primeiro lugar. Teremos de nos preparar para isso. E é exatamente sob o clima de preparação que é importante avaliarmos os resultados do rodízio de carros, para se analisarem as reações da população, as limitações estruturais da cidade e até mesmo para questionar, mais a fundo, quais as prioridades a serem atacadas no combate à poluição.
Não há como considerar que a adesão de quase metade do contingente de veículos destinado a permanecer na garagem, obtida no primeiro dia, possa comparar-se a um fracasso, mesmo porque não havia nem sequer a ameaça de imposição de multa.
É certo que a motivação foi perdendo força no decorrer da semana, contaminada pelo equivocado clima de insucesso, mas é imprescindível reconhecer o esforço da população em se engajar na batalha contra a poluição.
A experiência valeu também para deixar ainda mais evidentes as limitações do transporte coletivo em São Paulo. Não é certamente um problema que vá ser resolvido do dia para a noite, dadas as suas proporções, mas é necessário tê-lo sempre em perspectiva para que, paulatinamente, seja solucionado.
Outro aspecto que ficou evidente é a necessidade de priorizar o combate à poluição, por meio do ataque imediato das fontes mais perversas. No contexto dos veículos, resta claro que, antes de inibir a circulação indiscriminada, seria mais importante estabelecer critérios para restringir o tráfego de automóveis, ônibus e caminhões que, totalmente desregulados, andam por aí a expelir densas fumaças de seus canos de escapamento.
Mas convém lembrar que certamente não estaríamos a debater todas essas questões se não tivesse sido realizado o teste. Somente esse fator já é suficiente para aplaudir a experiência. É preciso, sem dúvida, buscar fórmulas para implementar um programa de combate à poluição, priorizando, como dissemos, os alvos a serem atacados. Mas, neste momento, o importante a registrar é que -com acertos e erros- começamos a tomar consciência das dificuldades dessa batalha.
Temos de nos preparar para vencê-la.

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