São Paulo, quarta-feira, 20 de setembro de 1995
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Vencidos e vencedores

CLÓVIS ROSSI

BONN - Parece estar funcionando à perfeição a estratégia da diplomacia brasileira de não se deixar "encurralar", como diz Fernando Henrique Cardoso, em uma única hipótese de parceria estratégica, aquela oferecida pela associação com os Estados Unidos.
Depois de um acerto preliminar com a União Européia, em Bruxelas, FHC saiu tão entusiasmado de seu encontro de ontem com o premiê alemão Helmut Kohl que chegou a dizer: "Raramente tive uma conversa que me entusiasmou tanto como essa".
Os dois governantes acertaram um contato futuro permanente e até uma iniciativa conjunta de âmbito planetário, conforme se lerá páginas adiante.
O êxito, desta vez, não é propaganda oficial. Basta ler o comunicado de imprensa difundido pela outra parte, a alemã. Nele, chega-se a roçar uma afirmação do então presidente norte-americano, Richard Nixon, segundo a qual "para onde se inclinar o Brasil, irá a América Latina".
Kohl, por seu porta-voz, Peter Hausmann, diz que "o Brasil assume (na América Latina) papel central como o mais importante parceiro comercial da Alemanha e o principal destino dos investimentos alemães".
É um curioso país esse com o qual o Brasil intensifica um namoro já antigo.
De manhã, FHC foi recebido oficialmente pelo presidente Roman Herzog. Quando as tropas de cerimônia chegaram, a águia negra, símbolo alemão, no topo do estandarte mais o ritmo marcial traziam inevitáveis recordações de outros tempos, infames tempos.
À tarde, o presidente foi depositar a habitual coroa de flores no cemitério de Nordfriedhoh. As tropas estavam lá de novo. Mas a inscrição na lápide era uma espécie de expiação coletiva: "Às vítimas de guerras e ditaduras".
No Brasil, pelo menos a segunda parte da homenagem até faria sentido. Mas 50 anos após o fim da guerra, os dois países podem se reconhecer na frase que Kohl disse a FHC sobre o fato de não haver mais vencidos e vencedores.
A Alemanha, vencida de ontem, vencedora de hoje, reforça laços com um país que, até agora, perdeu para ele próprio. Resta ver se, um dia, uma lápide qualquer sepultará essa derrota.

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