São Paulo, quinta-feira, 21 de setembro de 1995
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Paulinho da Viola canta contra a moda

LUIZ ANTÔNIO RYFF
DA REPORTAGEM LOCAL

Show: Às Margens do Rio
Artista: Paulinho da Viola
Onde: Tom Brasil (r. Olimpíadas, 66, Vila Olímpia, zona oeste de São Paulo, tel. 011/820-2326)
Quando: hoje, às 21h; amanhã e sábado, às 21h30; domingo às 20h30.
Quanto: de R$ 25 a R$ 45

O talento do cantor e compositor Paulinho da Viola é uma das poucas unanimidades entre críticos e músicos. Mas permanece um biscoito fino que poucos degustam -e em raras oportunidades. Não grava há seis anos, por exemplo.
Uma boa oportunidade é ir à Tom Brasil, onde Paulinho faz show de hoje a domingo.
Aos 52 anos de idade, 31 de carreira, o "príncipe do samba" jamais ganhou um disco de ouro (cem mil cópias vendidas) -um atestado de "popularidade" conferido pela indústria fonográfica.
Não que isso o angustie. Mas o deixaria feliz. "Todo artista quer ter sua obra reconhecida e quer vender o máximo que puder. Nunca me preocupei com isso, mas se eu receber um disco de ouro vai ser uma festa, vai ser ótimo".
Uma explicação para a vendagem baixa é a recusa do cantor em fazer concessões ao mercado.
"Eu não quero estar na moda. Minha preocupação é não estar na moda. Faço parte de uma geração que não tem muito essa coisa de moda", explica.
"Atravessamos uma fase em que todo o verão tinha que ter um ritmo novo, felizmente essa coisa já se diluiu um pouco."
A tecnologia é vista com reserva por ele. Como simples acessório, e, mesmo assim, dispensável.
"Nunca coloquei a tecnologia na frente do meu trabalho", diz ele, que já foi criticado por ter usado sintetizador em música da Velha Guarda da Portela ("Maldade Não Tem Fim").
Voz chata
Definitivamente, seu negócio não é moda, é modéstia.
"Não me considero um cantor. A primeira coisa que um cantor faz é se gostar muito. Submete toda a obra a sua maneira de interpretar. Eu sou um compositor que canta. Tenho até uma voz legal, mas a tendência é não gostar de algumas coisas que eu me ouço cantar. Dizer: Pô, que voz chata".
Não consegue sentir ciúme do sucesso que outros fazem com músicas dele. Como aconteceu com Marisa Monte, com "Dança da Solidão". Se sente orgulhoso.
Gal Costa anunciou que vai fazer um disco baseado na obra de Paulinho. O cantor já manda recado dizendo que, se Gal quiser, ele prepara algo inédito.
Medo de saudade
Normalmente, Paulinho é considerado um saudosista, algo que ele rejeita com veemência.
Para quem quer entendê-lo, o compositor confessa que sua relação com o tempo é peculiar.
"Tenho medo de sentir saudade, mas nunca senti. Quando canto um choro do Pixinguinha é como se ele estivesse aqui. Não canto como se fosse preciso retornar no tempo."
O passado tem, contudo, importância fundamental em seu trabalho. Cresceu frequentando as rodas de choro, levado pelo pai, o violonista César Farias. Perdeu a conta das vezes que viu Pixinguinha e Jacob do Bandolim juntos.
"Me lembro que essas rodas eram muitas concorridas. E havia a obrigatoriedade do silêncio quando estivessem tocando. Ninguém falava nada. As pessoas ficavam compenetradas, como um ritual".
Paulinho admira Orlando Silva, Radamés Gnatali, Jacob do Bandolim. Mas vive dividido entre Pixinguinha e Cartola. "Não dá para escolher entre um ou outro".
E já declarou que quer morrer ouvindo "Vou Vivendo", choro de Pixinguinha que considera perfeito na melodia e harmonia.
É essa relação própria com o tempo que o faz resistir às pressões da gravadora BMG-Ariola e adiar a entrada no estúdio.
Promete que um disco novo ainda esse ano, mas a data já foi adiada várias vezes. De qualquer forma, três músicas estão prontas.
É um músico relaxado, com pavor de ansiedade. "Às vezes largo o instrumento por meses. Agora não tenho um calo para tocar."

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