São Paulo, sábado, 23 de setembro de 1995
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Aquarela e garota

CARLOS HEITOR CONY

RIO DE JANEIRO - Na complicada seara da MPB há coisas engraçadas. Nos últimos 20 anos, quando sai o disco de Roberto Carlos a crítica cai em cima, garantindo que o compositor-cantor atingiu o fundo do poço, ninguém mais aguenta suas baladas, seus apelos ecológicos e suas trilhas sonoras para motéis.
O desse ano, segundo leio nas folhas, já tem vendidos dois milhões de cópias. É um respeitável fundo de poço, uma confortável decadência, um consolador fim de carreira.
Outra discussão que me diverte é sobre a música brasileira mais conhecida no exterior. Os entendidos juram que é "Garota de Ipanema" -sem dúvida, popularíssima, embora em declínio.
O "Samba do Avião" está subindo, pouco a pouco vai encostando no "Samba do Orfeu" (Bonfá), que no Brasil já foi sepultado, mas lá fora é tocado todos os dias.
Quem viveu no exterior, quem viaja por aí, sabe que a "Aquarela" do Ary não é apenas a mais conhecida de nosso repertório. Ela funciona como prefixo musical do Brasil. Teve roupagens sinfônicas (Morton Gould, Boston "Pops"), foi tema de filmes americanos e europeus, um deles, inglês, chamou-se "Brazil" por causa da trilha, o enredo nada tem a ver com a gente. Isso sem falar em Walt Disney, que lançou o grande sambão no mercado internacional.
Já rompi o ano-novo em lugares disparatados: na Suécia, em Nova York, Roma, Maiorca e Caribe. A bordo do "Norway", justo à meia-noite, esperava ouvir aquela balada escocesa, mas o que as orquestras dos três salões tocaram foi o brasil brasileiro do Ary. Na Suécia, o ritmo era de rumba, mas dava para entender.
Quando a seleção nacional chegou aos Estados Unidos, ano passado, foi saudada no aeroporto por uma banda de jazz tocando o quê?
Agora mesmo, na Alemanha, FHC visitou uma fábrica e o mulato inzoneiro substituiu o "Barril de Chope" local. Perguntei a um amigo italiano a causa dessa fixação. Ele era criança quando os americanos libertaram Roma. Os soldados cantavam duas músicas: "Moonlight Serenade" e "Brazil ". Só para terminar: Ary conseguiu sobreviver até a Carmen Cavallaro.

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