São Paulo, quarta-feira, 27 de setembro de 1995
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Inocentes úteis

FERNANDO RODRIGUES

SÃO PAULO - Aumenta o número de inocentes úteis no Brasil. Um certo Comitê para Libertação dos Presos Políticos está fazendo campanha para tirar da prisão as dez pessoas que sequestraram Abílio Diniz em 89.
O grupo distribui panfletos. Manda cartas para parlamentares em Brasília. Comparece a debates sobre direitos humanos para apregoar sua causa.
Quem paga essa campanha? Quem são essas pessoas? Nada disso está explícito no boletim de 41 linhas que andam distribuindo, sob o título "Verdades que não foram ditas sobre o caso do sequestro do empresário Abílio Diniz".
Não há "verdades". Há um fato. Dez pessoas sequestraram Abílio Diniz em 89, às vésperas da primeira eleição presidencial democrática no Brasil em 29 anos. Exigiram dinheiro para devolvê-lo com vida. Foram presas. Na cadeia, alegaram razões políticas.
Os dez sequestradores pegaram 28 anos de prisão. Estão no Carandiru, uma penitenciária em São Paulo. Nove deles são estrangeiros. Em 93, esta Folha revelou a existência de documentos de alguns dos sequestradores em um esconderijo em Manágua, na Nicarágua.
O bunker de Manágua, como ficou conhecido, continha dossiês sobre a vida de centenas de empresários em vários países. O local, lotado de armas, parecia o almoxarifado de uma central internacional do sequestro.
Um dos dossiês de Manágua era sobre Diniz. Uma cópia desse documento já havia sido encontrada em 89 pela polícia brasileira junto com os sequestradores do empresário.
Agora, esse autodenominado "grupo de alunos e professores universitários de direito, sociologia, história e algumas pessoas de diversos segmentos da sociedade" quer provar que o sequestro foi político e com isso reduzir a pena dos sequestradores -e libertá-los.
Ingênuo, o "grupo" raciocina que o passado de esquerda dos sequestradores os qualifica como criminosos políticos. Uma piada. O único brasileiro envolvido, por exemplo, foi militante da Convergência Socialista.
Talvez esse movimento seja só uma brincadeira. Afinal, por essa lógica, a população inteira da Rússia poderia roubar à vontade, no mundo inteiro, e alegar razões humanitárias e políticas.

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