São Paulo, domingo, 7 de janeiro de 1996
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Ilustre desconhecido

SÍLVIO LANCELLOTTI

A crônica falta de memória que assola este país mais o desconhecimento crucial da história do futebol no mundo impediram que a imprensa brasileira registrasse, numa notinha que fosse, a morte, nesta semana, de Karl Rappan.
Opa! Karl Rappan? Quem será esse cidadão, deve perguntar o leitor mais jovem. Numa resposta simples e diretíssima, eu afirmo que se trata de um dos maiores revolucionários das táticas do futebol em todos os tempos.
Nascido em Viena no dia 26 de setembro de 1905, Rappan brilhou como zagueiro de três grandes clubes de sua cidade, o Wacker entre 24 e 28, o Áustria entre 28 e 29, o Rapid entre 29 e 31.
Era um brilhante marcador, mas se destacou anotando tentos em cobranças de infrações. Foi campeão de sua terra em 1927, 1929 e 1930. E, principalmente, fulgurou como um dos astros do chamado "Wunderteam", o time maravilha com que o treinador Hugo Meisl encantou o mundo naqueles idos.
O "Wunderteam" foi o primeiro do planeta a exibir alguma lógica tática, estrutura de jogo, sistema de defesa e ataque, o "MM" de dois beques, três médios, três armadores e dois avantes -que redundaria no WM da Inglaterra.
Em 31, ainda atleta, mas também um estudioso da teoria do futebol, Rapan idealizou o chamado "Verrou", ou "Riegel", ou "Módulo Ferrolho", um sistema de defesa fundamentado em dois laterais e dois centrais que se revezavam na perseguição implacável ao centro-atacante do adversário.
De "Verrou" nasceu a idéia do líbero, que Rappan implantou pioneiramente como técnico, aos 27 anos, no Servette, de Genebra. Graças ao "Ferrolho", Rappan foi nove vezes campeão na Suíça. Com meros 30 anos, assumiu a direção da seleção e lá permaneceu até meados da década de 60.
Conheci Rappan, pessoalmente, durante a Copa de 70, no México, no apogeu do futebol ofensivo do Brasil. Na sua carreira, Rappan se orgulhava de dois ótimos resultados, dois empates, exatamente diante do Brasil, 2 x 2 no Pacaembu, durante a Copa de 50, 1 x 1 num amistoso em Zurique, 1956.
Apesar do apelido, o "Ferrolho" de Rappan não se limitava à proteção da meta. Na Copa de 54, a Alemanha levou a taça com um sistema igualzinho. Na Copa de 70, a Itália reproduziu o esquema e foi vice. Em 82, ganhou o ouro.
Rappan também idealizou, na década de 50, o embrião dos torneios interclubes europeus. Morreu na terça-feira, aos 90 anos.

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