São Paulo, quarta-feira, 17 de janeiro de 1996
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Que se faça justiça

ANTONIO CARLOS DE FARIA

RIO DE JANEIRO - O país tem hoje a chance de dar mais um passo para o completo estabelecimento do Estado de Direito. Está na pauta de votações da Câmara o projeto que determina que os crimes da Polícia Militar sejam julgados pela Justiça comum.
A aprovação do projeto, que depois será submetido ao Senado e à sanção do presidente da República, restabelece o princípio de que a Justiça não pode fazer distinções em razão das atividades dos julgados.
O privilégio de uma Justiça especial para os crimes da Polícia Militar estimulou um sistema de impunidade. A polícia passou a ocupar um papel de geradora da violência, no lugar de ser inibidora.
Pesquisa do Datafolha, no Rio e em São Paulo, apontou que 74% dos entrevistados são favoráveis a que os crimes da PM sejam julgados pela Justiça comum. A mesma pesquisa mostrou que 61% associam a polícia a uma imagem negativa.
Os entrevistados reclamaram do despreparo dos policiais, da violência empregada contra os suspeitos e do abuso de autoridade. Esses fatores, mais a crença de que a polícia está ligada ao crime organizado, geram o sentimento de insegurança, fazendo com que 67% dos entrevistados cariocas tenham mais medo do que confiança na PM.
O perfil da polícia atual foi definido não para garantir a segurança dos cidadãos, mas para preservar uma forma de Estado. Os setores mais abastados da sociedade se acostumaram a conviver com esse esquema e distribuem propinas para não serem atingidos pela truculência que sobra para os pobres.
A mudança desse sistema começa pela restrição do privilégio da Justiça Militar. Só crimes de natureza estritamente militar continuarão sob sua jurisdição, como deserção ou motim. Atualmente, um policial que cometa um crime usando o revólver da corporação passa a ter direito ao julgamento especial.
A proposta que será votada hoje pelos deputados cria a possibilidade de que a sociedade comece a controlar a polícia. Ao mesmo tempo é preciso que se provenha o trabalho policial de condições que garantam dignidade no seu exercício. Essas são condições básicas para a construção da cidadania.

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