São Paulo, sábado, 27 de janeiro de 1996
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O mundo e nós

CLÓVIS ROSSI

GENEBRA - Fala-se tanto em globalização, mas o Brasil continua de costas para ela.
Começa a ficar monótono acompanhar solitariamente acontecimentos internacionais relevantes, como a recente eleição palestina, para a qual só esta Folha e a revista "IstoÉ" enviaram representantes.
Topei até com uma jornalista da Macedônia, cuja população total não deve ser maior do que as comunidades judaica e árabe do Brasil, para as quais supõe-se que o assunto tenha algum ou muito interesse.
Dá até para entender a ausência. É uma cobertura cara. Mas conheço na Folha um velho sábio que repete, uma e mil vezes, que não há "free lunch" (almoço grátis). Se a mídia quiser "almoçar" leitores, vai ter de gastar algum com o almoço, para não continuar oferecendo prato frio ou requentado.
O outro argumento comum é o de que as agências internacionais suprem as necessidades. Elas, de fato, até que fazem um bom trabalho, mas:
1 - Oferecem uma visão fragmentária e pontual da realidade, sem o quadro mais abrangente que, em tese pelo menos, um enviado especial consegue (quando consegue, claro).
2 - Se esse argumento fosse válido, os grandes jornais do Rio e de São Paulo deveriam desmontar suas sucursais em Brasília, por exemplo, e comprar o material do "Correio Braziliense", o maior da cidade.
Como nunca passou pela cabeça de ninguém, nas grandes redações, cometer tal loucura, deduz-se que Brasília é, para o jornalismo brasileiro, mais importante do que o mundo.
De fato o é, muitas vezes. Mas não pode ser sempre, sob pena de se apequenar a visão de mundo oferecida ao distinto público.
Essa não é uma discussão que interessa apenas ao mundo jornalístico. Jornais são ou tentam ser apenas um espelho do que é a sociedade à qual se dirigem. Se ela continuar distraída, olhando para dentro, o mundo vai engoli-la. Acho até que a globalização engolirá a sociedade brasileira de qualquer jeito. Mas, pelo menos, ela podia ver chegar de frente esse momento.

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