São Paulo, terça-feira, 15 de outubro de 1996
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Deportado diz que foi discriminado

ROGERIO WASSERMANN
DA REPORTAGEM LOCAL

O professor Paulo César Vicente, 33, acusa o serviço de imigração britânico de discriminação. No dia 30 de setembro, ele foi impedido de entrar na Inglaterra, onde faria um curso de especialização em inglês na universidade de Essex.
Proprietário de uma escola de inglês no bairro Bosque da Saúde (zona sul de São Paulo), Vicente já havia estado no país duas vezes, em 87 e 93, para estudar. Nunca teve problemas. Desta vez, o visto de entrada -que é concedido quando o visitante entra no Reino Unido- foi negado e o professor, deportado.
"Eu estava com toda a minha documentação em ordem, com passagem de volta marcada, dinheiro suficiente para me manter lá, cartão de crédito e carta da universidade onde faria o curso, mas, mesmo assim, o oficial da imigração me negou o visto."
Vicente diz que estuda a possibilidade de entrar com uma ação judicial para indenizá-lo pelos prejuízos e por danos morais.
Vicente disse que seu "calvário" começou às 10h20, quando chegou ao aeroporto de Heathrow, em Londres, vindo de Paris, onde havia passado três dias visitando amigos. A maratona só terminou às 23h30, de novo em Paris, quando foi embarcado para o Brasil.
Em Londres, o professor disse ter ficado quase cinco horas incomunicável, passando por interrogatórios e revistas minuciosas na bagagem. Foi informado então que seu visto fora negado e que ele seria deportado, tendo de voltar no vôo seguinte para Paris.
Para ele, o oficial da imigração agiu de maneira preconceituosa. "Ele disse, a um certo momento, que a situação econômica no Brasil era muito ruim e que muitos brasileiros queriam morar lá, e que, por isso, achava que eu também queria ficar por lá."
Segundo Vicente, o oficial negou o visto sob a justificativa de que ele não conseguira convencê-lo que realmente pretendia deixar a Inglaterra após o curso.
Mais problemas
Na hora da extradição, um novo problema: a companhia Air France, que deveria levá-lo a Paris no vôo das 15h05, não aceitou transportá-lo de graça.
O serviço de imigração se negou a pagar a passagem, como deveria ser feito de acordo com as leis internacionais de imigração. Vicente acabou pagando a passagem, 60 libras (cerca de R$ 100), de seu próprio bolso.
Ele embarcou para Paris no vôo das 15h30, mas o passaporte ficou retido com a tripulação do avião. "Eles me disseram que o meu passaporte seria devolvido quando chegasse a Paris", diz.
Ao chegar à França, um oficial do serviço de imigração francês o aguardava na saída do avião com seu passaporte na mão. Novamente, disse Vicente, ele foi levado para uma sala do aeroporto e deixado incomunicável.
"Não me deixaram telefonar para a embaixada nem para os meus amigos em Paris."
Às 20h, um oficial lhe disse que embarcaria de volta para o Brasil num vôo às 23h30.
"Às 21h30, houve troca de turno. O oficial que entrou me deu 100 e poucos francos e me pediu para comprar duas garrafas de uísque para ele. Fiquei achando que ele queria aprontar comigo."
Ele acabou conseguindo fazer um acordo com o oficial, que o deixou telefonar em troca do uísque. Ele ligou para sua escola no Brasil e para os amigos em Paris, que acionaram o Itamaraty e a embaixada brasileira.
O professor conseguiu o passaporte de volta, sem comprar o uísque. "Eu disse que minha religião não me permitia comprar bebidas. O oficial ficou furioso e começou a gritar comigo."
Vicente diz que o telefone da sala onde estava começou a tocar e percebeu que falavam dele, mas não entendeu o quê. "Tenho um pouco de problema com o francês, que não falo bem."
A movimentação, no entanto, acabou não dando em nada. Pouco antes do horário previsto para o vôo, um oficial veio buscá-lo e o deixou na entrada do avião. "Ele me levou até lá e disse: 'The nightmare is over' (o pesadelo acabou, em inglês)."
Ao chegar ao Brasil, Vicente contactou o Itamaraty e o consulado britânico. "O que eu queria era uma retratação, porque se eu quiser tirar visto de outros países terei problemas. Meu passaporte tem o carimbo do visto negado."

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