São Paulo, domingo, 20 de outubro de 1996
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Documentário retrata Welles como vítima

INÁCIO ARAUJO
CRÍTICO DE CINEMA

Todos os interessados conhecem, mais ou menos, a história de "A Batalha em Torno de Cidadão Kane", documentário de Thomas Lannon e Michael Epstein.
Ao saber que era a figura retratada em "Cidadão Kane" (1941), o primeiro filme de Orson Welles, Wil- liam Randolph Hearst, magnata da imprensa, caiu matando em cima do filme e do diretor.
Pretendeu que os negativos do filme fossem destruídos, que não fosse exibido. Pressionou o FBI para que investigasse a vida de Orson Welles, como comunista. Jogou colunistas contra o diretor.
É em torno desse episódio que gira o filme, que chega ao Brasil precedido por uma bela repercussão no Sundance Festival.
Talvez uma repercussão exagerada. Temos visto, nos últimos anos, exemplos de documentários que renovam o gênero em várias direções: "Arquitetura da Destruição" é um ensaio sobre os fundamentos do nazismo; "Leni Riefenstahl: A Deusa Imperfeita", uma biografia que utiliza as imagens (atuais e antigas) para dar conta de uma personalidade -a cineasta que fez filmes para o regime nazismo- e de uma época.
Um terceiro exemplo será mostrado brevemente no Brasil. É "Basquete Blues", que acompanha durante quatro anos a vida de duas promessas do basquete norte-americano. Este consegue, ao final, criar um verdadeiro suspense sobre o destino de seus personagens (tão mais suspense quanto sabemos que eles são reais).
"A Batalha em Torno de Cidadão Kane", mais academicamente, alinhava os fatos. Sua ótica, em princípio, favorece o cineasta e desfavorece o magnata. No que tem de mais interessante, discute o poder da imprensa, sem deixar de discutir o poder do cinema.
Como norma, no entanto, endossa o "vitimalismo" de Welles.
É fato que, desde esse episódio, a vida profissional de Welles tornou-se difícil. Ainda assim, o filme não se preocupa em desenvolver hipóteses mais interessantes, como o mito do seu fracasso, cuidadosamente construído por Welles.
Por fim, para além da destrutividade de Hearst, ou da autodestrutividade do cineasta, o fato é que Orson legou uma obra magnífica. "A Batalha" esmiuça um episódio capital em sua vida -e, pela importância de "Cidadão Kane", do próprio cinema-, mas não chega a fazer avançar a arte do documentário.

Filme: A Batalha em Torno de Cidadão Kane
Produção: EUA, 1995, 108 min
Direção: Thomas Lennon, Michael Epstein
Onde: hoje, no CineSesc, às 17h30

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