São Paulo, segunda-feira, 21 de outubro de 1996
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Nada Surf é tudo de que o rock precisa

ÁLVARO PEREIRA JÚNIOR
ESPECIAL PARA A FOLHA

Você tem que namorar o melhor brotinho da escola. Nunca seja o último a ser escolhido na educação física.
Se cruzar os caras do futebol, faça uma social. É fundamental que os professores adorem você. Nas festas, seja sempre o centro das atenções.
E o principal: jovem nenhum pode deixar que a sujeira se acumule nos cabelos. É preciso lavá-los pelo menos uma vez a cada duas semanas. Ouviu bem? Semana sim, semana não.
Poderia ser o "Guia Infernal de Sobrevivência Adolescente", porém se chama "Popular". E não é um livro, mas uma canção. Na letra, todo esse emaranhado de regras sociais para jovens.
"Popular" é a terceira faixa de "High/Low", o álbum da banda nova-iorquina Nada Surf, que já tem lugar assegurado entre os melhores do ano.
"High/Low" é uma surpresa absoluta, não só pela qualidade, incomum em um álbum de estréia, como pela vida nada rock and roll dos caras do Nada Surf.
O guitarrista/vocal, Matthew Caws, e o baixista, Daniel Lorca, são dois filhinhos-de-papai de marca maior, egressos do finésimo Lycée Français de Nova York.
Em geral, grupos de bacanas são chegadas a uma discurseria brava, filosofice de quintal, como dezenas de bandas brasileiras cansaram de nos ensinar.
Mas, aqui, estamos diante de um CD de primeiríssima.
As fontes do Nada Surf são claras -as guitarras vêm do Sonic Youth, e as mudanças bruscas de andamento derivam do Pixies. Eles costumam citar também o Mission of Burma, banda pós-punk praticamente desconhecida fora de sua Boston natal, mas de enorme influência no rock dos anos 80 e 90.
"Popular" já toca sem parar nas rádios americanas espertas, e é de tal maneira grandiosa, cativante na sua paranóia, que pode acabar transformando o Nada Surf numa daquelas bandas de uma música só.
Se isso acontecer, terá sido injustiça brava, porque o CD dos caras tem dez faixas que mais parecem um curso completo de rock and roll.
Abre com "Deeper Well", uma espécie de Oasis com vergonha na cara. Vai para "The Plan", um rock de estrada que parece feito por gente muito mais velha do que eles.
Passa por "Icebox", uma balada comovente sobre mudanças bruscas de estado de espírito.
Fecha com "Zen Brain", outra balada no limite da sanidade mental.
E, bom, tem "Popular", angst e hormônios em volume máximo, resumo detalhadamente cruel dessa experiência insuportável que se chama vida em sociedade.
*
Na semana passada, eu chamei de "John" o guitarrista James Honeyman-Scott (1957-1982), que tocava nos Pretenders.
Como dizia o Agente 86, "desculpe por isso".

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