São Paulo, quinta-feira, 24 de outubro de 1996
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O que a CBF vai fazer com o dinheiro da Nike?

JOSÉ GERALDO COUTO
ESPECIAL PARA A FOLHA

A CBF vai nadar em dinheiro. Com o contrato que vai assinar com a Nike, fornecedora de material esportivo, deve receber nada menos que US$ 200 milhões nos próximos dez anos, o que dá uma média de US$ 20 milhões por ano, ou US$ 1,6 milhão por mês.
A notícia deixa o torcedor com a orelha em pé. A pergunta que fica no ar é: o que a CBF vai fazer com tanto dinheiro?
A seleção brasileira de futebol -que passa a ser a grande vitrine da Nike- não deve consumir nem perto disso, a não ser que os jogadores passem a comer desde já caviar no café da manhã, no almoço e no jantar.
Ou então que os saltos altos de nossos craques sejam todos encomendados a grifes italianas, cada um com um design exclusivo.
Num país pobre e desorganizado como o Brasil, em que os estádios de futebol estão vazios, os clubes falidos, e os campeonatos deficitários, proponho que a bufunfa da Nike seja aplicada para revitalizar o esporte no país e atrair de volta o público torcedor.
Pouco nos adianta ter um "dream team" excursionando e encantando o mundo, como faziam (não sei se ainda fazem) os Harlem Globetrotters, se nossos estádios continuarem às moscas e nossos clubes devendo salário aos atletas.
Enquanto isso, os jogadores que mais se destacam vão jogar na Itália, na Espanha ou no Japão.
Algumas sugestões são simples e óbvias. A CBF poderia, por exemplo, ajudar no reaparelhamento dos nossos combalidos estádios, com reformas que os modernizem e aumentem a segurança do torcedor.
Poderia ser modernizado também o sistema de fabricação, venda e controle dos ingressos, de modo a evitar a evasão de rendas e a falsificação de entradas.
Outra iniciativa a ser considerada é a criação de alguma forma de subsídio que diminua o preço dos ingressos.
Convenhamos: R$ 15 por uma entrada para arquibancada, em estádios sem segurança e sem conforto, é um preço demasiado alto, sobretudo se levarmos em conta o baixo poder aquisitivo da maioria da população.
Algo a se pensar pode ser a criação de um "ingresso do trabalhador", ou coisa que o valha. No caso, essa seria não só uma maneira de aumentar o público e a renda dos jogos, mas também de atrair de volta aos estádios os trabalhadores assalariados, que sempre formaram a grande massa dos torcedores e que hoje, por falta de dinheiro e medo de tomar pedrada, preferem ficar em casa vendo televisão.
Há outras inúmeras maneiras de gastar bem esse dinheiro: campanhas publicitárias contra a violência e de valorização do futebol, criação de escolinhas de futebol para crianças pobres, formação de cursos para treinadores e preparadores físicos etc.
Hão de surgir outras propostas, até mais pertinentes que as elencadas acima.
O importante é que a imprensa, os clubes, os torcedores e amantes do futebol em geral fiquem de olho aberto.
Senão, o mais provável é que essa dinheirama toda desapareça sem deixar rastro, a não ser talvez em algumas privilegiadas contas bancárias.

Matinas Suzuki Jr., que escreve nesta coluna às quintas, sábados e terças, está em férias

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