São Paulo, sábado, 26 de outubro de 1996
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Gravadoras apostam no rock onanista

MARCELO RUBENS PAIVA
ESPECIAL PARA A FOLHA

Gravadoras de peso como EMI, Natasha Records e PolyGram têm apostado em bandas novas e refeitas -é o rock brasileiro revelando talentos. Nomes? Lagoa, Os Ostras, Baba Cósmica, Maria do Relento, entre outras.
O que elas têm em comum? O jeito desbocado de ser e o onanismo (automasturbação manual masculina) como tema.
"Moreninha do Pará", "Coelhinho, Se Eu Fosse como Tu" e "Esporrei na Manivela", músicas de domínio público cantadas em sete versos nos recreios escolares, ganharam novas parceiras. Desta vez, registradas.
"O homem primitivo até hoje é manual/ A mulher sofisticada tá na era digital", diz a letra "Maricota" (Baba Cósmica), cujo refrão não deixa dúvidas: "Tava no banheiro na maior sensação/ Fazendo justiça pelas próprias mãos".
"Eu vivia uma vida muito ativa e mais legal/ Incluindo uma vasta atividade manual", começa a letra da música "Revista de Mulher... Pelada!" (Lagoa).
Citando as qualidades das mulheres de cada mês de uma revista, a letra atesta que "a garota de agosto tem muito pentelho", "a buça de setembro não tem nenhum defeito" e a moça de março "é a mais gostosa que eu já vi/ só perde na minha bronha pra garota de abril".
Na música "Gisleide Neide" (Lagoa), que descreve uma "empregada eficiente", "o português da padaria dava até o que não tinha/ pra um dia podê aferruá/ tava cansado da batida da puleta..."
Já os Ostras não perdem tempo com metáforas. Diz a letra de "Uma, Duas ou Três (Punheta)": "Você não sabe quanta falta que você me fez/ E todo dia, no banheiro, eu descascava uma, duas, três"
Paradeira dos 90
"Será que é o HIV introduzindo a punheta no imaginário?", pergunta Wandi Doratiotto, do Premê (Premeditando o Breque), uma das primeiras bandas a incutir um pouco de humor na ressentida MPB do começo dos anos 80.
"Acho que essas bandas refletem a paradeira dos anos 90. É uma moçada articulada, ligada na Internet, mas que acha que tudo parece uma grande punheta", explica Doratiotto.
Segundo ele, o brasileiro tem cada vez menos problemas para falar de seus tabus. Lembra que existem colunistas de jornais divagando sobre os efeitos da masturbação e reportagens sobre o comportamento sexual íntimo das pessoas.
"Lemos nas revistas e jornais detalhes das relações sexuais das pessoas. Antes, tínhamos mais pudor", conclui.
"É típico dos anos 90. Tanta meleca pro cara aguentar, acaba dando nesse gênero", teoriza Carlos Eduardo Miranda, diretor do selo Excelente Discos, dos Ostras.
Miranda diz que, no Rio Grande do Sul, várias bandas fazem sucesso com o gênero desbocado.
"Aqui, elas não conseguem penetração. O humor paulista é diferente. É baseado no preconceito, no tirar a onda da cara dos outros. O gaúcho tira onda de si mesmo."
"As gravadoras gostam da nossa boca mole. Temos dificuldades de entrar em algumas rádios, que acham que não pertencemos ao perfil. Mas na 89 FM, o povo gosta", diz Tadeu Patola, do Lagoa.
"Está todo mundo fazendo a mesma coisa não por ser apelativo, mas para botar a bobagem em dia", completa Patola.
Mamonas Assassinas
Uma análise simplificada creditaria ao sucesso dos Mamonas Assassinas a quantidade de besteiras que tem se cantado pelo Brasil.
Ainda ecoam nos ouvidos da tradicional família brasileira as expressões cunhadas pelos rapazes de ouro de Guarulhos, como "passou a mão na minha bunda" ou "ainda não comi ninguém".
"Outro dia, minha sobrinha estava cantando 'Xilép'", lembra Patola. "Entra pizza, sai a pizza, meleca na cueca, lambuza na blusa, no zíper da calça, e mama na gueba, xilép, xilép com a língua", diz "Xilép na Língua" (Lagoa).
"Comparam a gente com os Mamonas. É o mesmo produtor, mas não somos os Mamonas, nem esperamos vender 1 milhão de discos. Fazemos rock sem compromisso e com diversão", diz Patola.
O Lagoa, antigo Lagoa 66, está há 10 anos na estrada. Lançou "Agora Sai!" há duas semanas. O produtor é Rick Bonadio, o mesmo de Mamonas e Baba Cósmica.
"Da mesma forma que os Mamonas abriram um pseudo-espaço, eles fecharam as portas para bandas que façam besteirol. Nas rádios, é o mesmo, não querem mais bandas com a cara dos Mamonas", diz Bonadio.
Bonadio afirma que os Mamonas faziam rir e tinham uma performance diferenciada no palco e que o som do Lagoa é mais sofisticado.
"Os Mamonas abriram um espaço ilusório. As gravadoras abriram os olhos para o rock nacional depois deles", teoriza Bonadio.
"O tipo dos Mamonas gastou. Não acho que exista algo em comum com os Mamonas. Os Ostras nem são desbocados nem cômicos", explica Miranda.
Ele diz que sua gravadora não procura um tipo de som específico, mas prioriza a originalidade. "Procuro banda que tenha tarimba e queira fazer sucesso. Quero gente a favor, não contra."
Uma das bandas de maior sucesso da Excelente é Maria do Relento, do Rio Grande do Sul, cujo CD foi produzido por Branco Mello, Sérgio Britto, Charles Gavin, dos Titãs, e pelo próprio Miranda.
"Conhece o Mário?/ Aquele que te emenda e te encarca atrás do armário", diz uma de suas letras ("Conhece o Mário?").
E a Banda das Velhas Virgens lançou nesta semana "Vocês Não Sabem como É Bom Aqui Dentro!!" ("dentro" se refere à calcinha de uma mulher). Uma das faixas: "Siririca Baby".
Biscoito fino.

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