São Paulo, domingo, 27 de outubro de 1996
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Receita menor faz sindicato se endividar

FREDERICO VASCONCELOS
DA REPORTAGEM LOCAL

O sindicato dos metalúrgicos do ABCD, uma das mais fortes e ativas organizações do movimento sindical brasileiro, está recorrendo ao crédito bancário para manter as suas atividades.
A queda da arrecadação, atribuída ao desemprego, obrigou o sindicato, com sede em São Bernardo, a sacar além do limite de sua conta especial no Banco Safra.
Desde setembro, o sindicato dos metalúrgicos do ABCD deve ao sindicato dos bancários de São Paulo, ambos filiados à CUT (Central Única dos Trabalhadores).
"Já vivemos momentos piores, a novidade é que não estamos vendo a saída da crise, que provocou uma redução drástica da categoria", diz Tarcísio Secoli, 40, diretor administrativo e financeiro da entidade.
Cortando o som
Com o aperto, o sindicato dos metalúrgicos do ABCD dispensou 30 dos 247 funcionários, vendeu um caminhão de som e quatro dos sete telefones celulares.
"Em 15 meses, perdemos cerca de 23 mil postos de trabalho", diz Secoli. As demissões nas indústrias têm provocado uma redução de 1,5% ao mês na base sindical.
O sindicato concentrou fornecedores, obteve redução de preços e alongamento de prazos. Eliminou despesas fixas, suspendeu a compra de equipamentos e as obras finais de seu clube de campo.
Numa evidência de que a crise não é geral, o sindicato dos bancários paulistas está comprando um clube de campo, por R$ 1,5 milhão, em parcelas, até janeiro.
E se os metalúrgicos do ABCD vivem dias difíceis, os comerciários paulistas -graças à ampla base de um setor em expansão- não sentem os efeitos dessa crise.
Ricardo Patah, vice-presidente do sindicato dos comerciários de São Paulo, diz que a receita do sindicato mantém-se estável há três anos. "Apesar das dispensas, o comércio é o setor que menos sofreu", diz Patah. "Muitas indústrias estão deixando suas áreas, que são transformadas em shopping centers", diz.
O sindicato dos comerciários -vinculado à Força Sindical- não revela os dados da arrecadação. "É para evitar pedidos de empréstimos", diz Patah, com ironia.
Fugindo dos bancos
Os empréstimos entre sindicatos não são uma prática incomum, embora não seja alardeada (os valores não são revelados).
"São empréstimos de curto prazo e de pouco montante", diz Ricardo Berzoini, presidente do sindicato dos bancários de São Paulo. "É para que os sindicatos fujam dos altos juros dos bancos", diz. Cobra-se a correção do período.
Para os sindicalistas, o empréstimo é uma manifestação de solidariedade, semelhante ao apoio de outras categorias nas greves de difícil mobilização. Na recente campanha salarial dos bancários, o sindicato arregimentou piqueteiros que não eram bancários.
O socorro entre sindicatos também pode atender a prioridades discutíveis. O sindicato dos metalúrgicos de Osasco, por exemplo, recorreu a empréstimo junto à federação dos metalúrgicos, ambos da Força Sindical, para tocar a construção de uma nova sede.
Perdas no campo
No movimento sindical dos trabalhadores rurais não há descontos automáticos nos salários.
A arrecadação dos trabalhadores em regime de economia familiar também é disputada pela CNA (Confederação Nacional da Agricultura), entidade patronal.
"Estamos vivendo um dos momentos mais estáveis financeiramente dos últimos 15 anos. Porém, nunca estivemos tão vulneráveis", diz Hilário Gottselig, tesoureiro geral da Contag (Confederação Nacional dos Trabalhadores na Agricultura).
Em 1995, a Contag registrou uma receita de R$ 4,9 milhões. Há ações judiciais contra a contribuição confederativa e houve queda na arrecadação dos sindicatos.
Gottselig avalia uma perda de 20% da contribuição sindical.

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