São Paulo, segunda-feira, 28 de outubro de 1996 |
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1994, o ano que não terminou
LUÍS NASSIF Os sobressaltos provocados pelos resultados da balança comercial são herança direta das irresponsabilidades cometidas na partida do Real. Devem servir para duas providências.A primeira, a necessidade de o governo trocar boas explicações por ações concretas de curto prazo. A segunda, pelas lições políticas a serem extraídas do episódio. Uma série de medidas adotadas ao longo dos últimos meses -como a abertura de linhas de financiamento às exportações pelo BNDES- não chegou à ponta. Patina-se na falta de mecanismos gerenciais, capazes de colocar projetos em prática. Recentemente, o Ministério do Planejamento implantou um sistema de gerenciamento de projetos, visando administrar os 42 projetos contidos no programa "Brasil em Ação". Há a necessidade de que esses mecanismos sejam colocados prioritariamente no estímulo às exportações. Esse é, hoje, o objetivo prioritário a ser perseguido. O governo tranquiliza-se acenando com uma série de mecanismos e processos que darão resultado no futuro. Isenção de ICMS nas exportações, investimentos externos que aliviarão a balança, investimentos em infra-estrutura e tudo o mais. Mas o médio prazo só estará garantido se se administrar o curto. Os pacotes A segunda lição é sobre os absurdos cometidos na partida de planos econômicos, nos quais meia dúzia de iluminados se outorgam o direito de interferir na vida de todo o país e arbitrar ganhos e perdas na economia a seu talante -escudados na popularidade superficial granjeada pela redução temporária da inflação. Foi a pior herança deixada por esses anos de pacotes econômicos. Mudanças cambiais são peça-chave na vida de um país. Interferem nas relações de ganhos e perdas entre setores, no nível de renda interno, na balança comercial. Pelas complexas implicações, mudanças bruscas são submetidas a processos de decisão que não podem ser abertos, mas são extremamente rígidos -porque todos, do presidente ao ministro, sabem que sua cabeça estará a prêmio se não houver justificativas plausíveis a posteriori. Aqui, cometeram-se absurdos em um ambiente mais propício a filmes como "O Rato que Ruge" do que a uma moderna nação emergente. O vácuo criado por um presidente incapaz até o limite da normalidade foi ocupado por experimentalismos que não obedeciam a nenhuma análise mais aprofundada, nenhuma sensação de risco. Na partida do Real, o câmbio despencou 15% da noite para o dia, por conta de uma mudança desastrada na fixação das bandas. Essa mudança não estava prevista nem sequer na elaboração teórica do plano -de autoria do economista Pérsio Arida. Eleições Cometido o erro, o que ocorreu em seguida? Descobriu-se que, eleitoralmente, a mudança era positiva. Ela ajudava a segurar os preços internos e dava a sensação de moeda forte. O primeiro erro foi involuntário, embora fruto da extraordinária auto-suficiência de que se viram revestidos os economistas que conduziram o plano. Sua manutenção decorreu de uma estratégia eleitoral -que foi acompanhada pelo então candidato Fernando Henrique Cardoso. Nos meses seguintes, ao primeiro sinal de problemas na área de preços, a equipe econômica -conduzida pelo então ministro da Fazenda Ciro Gomes- procedeu a uma série de medidas arbitrárias, de absoluta irresponsabilidade. A abertura geral às importações não só estrangulou a balança comercial como permitiu à indústria automobilística os maiores lucros da sua história, às custas da deterioração da balança comercial. Só no final de dezembro, com a eleição garantida, decidiu-se enfrentar a questão. Dentro do governo, Pérsio Arida tornara-se voz forte em defesa da mudança da política cambial, alertando para problemas futuros na balança comercial. Seguiram-se decisões desastradas que acabaram fazendo com que, a partir de abril, se varresse a questão cambial para baixo do tapete. A política cambial foi mantida por pura inércia, por receio do governo de tentar mudar novamente o câmbio e passar pelos pesadelos de março -quando erros no anúncio de mudanças cambiais provocaram fugas de quase US$ 10 bilhões. Espantou-se o fantasma por alguns meses -inclusive com alguns sinais presumivelmente promissores das exportações, no início do ano, que acabaram não se concretizando. Agora, o fantasma voltou para puxar o país pelo pé. Texto Anterior: Cavallo faz críticas diretas a presidente Próximo Texto: Arapuã cobiça Casa Centro e sobe na Bolsa Índice |
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