São Paulo, sexta-feira, 1 de novembro de 1996 |
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"Pasolini" retrata o martírio do artista
JOSÉ GERALDO COUTO
O trágico: poeta que celebrava em prosa, verso e imagem os jovens subproletários da periferia romana, Pasolini acabaria morto por um deles -ou alguns deles, como sugere o filme. Flagrado com o carro de Pasolini na madrugada em que o poeta apareceu morto, Giuseppe Pelosi confessou-se autor único do assassinato. As investigações indicariam que outros homens devem ter participado do crime. O simbólico: comunista, católico e homossexual, Pasolini era um divisor de águas na cultura italiana, e sua morte atiçou um confronto apaixonado de reações. Para uns, ele era um dos intelectuais mais lúcidos e íntegros da Itália. Para outros (os direitistas, claro, mas não só eles), um degenerado, um falso profeta. Na melhor tradição do cinema investigativo italiano, o filme mostra como o inquérito policial foi influenciado por essas paixões. A posição de cada indivíduo, órgão de imprensa ou partido diante do crime refletia sua opinião sobre o homem Pasolini. Ao misturar a reconstituição ficcional dos fatos com cenas documentais, o filme alcança um tremendo impacto dramático. Os atores estão perfeitos, sobretudo Carlo De Filippi, como Pelosi. Mas o mais emocionante do filme são os "flashes" documentais, em preto-e-branco. Neles vemos o próprio Pasolini sorrindo ao volante de sua Alfa Romeo, ouvimos os discursos comovidos de amigos como Moravia e Bertolucci, o depoimento atarantado do ator Nineto Davoli. As palavras de Pasolini citadas no filme soam dolorosamente verdadeiras e proféticas. Não só aquelas que acusam "respeitáveis" políticos italianos de corrupção e envolvimento com a Máfia, mas principalmente seus ataques à fascistização da vida cotidiana pela indústria cultural. O mais terrível não é nem a possibilidade -deixada em aberto- de o assassinato de Pasolini ter sido tramado por grupos fascistas. O mais terrível é ouvir a "gente do povo" que ele tanto amava dizer que seu fim foi merecido. Um de seus advogados diz: "O fascismo o matou. Senão fisicamente, pelo menos no sentido de que o fascismo é hoje o ar que nos envolve". Essa é a "mensagem" desse filme contundente. Filme: Pasolini - Um Delito Italiano Direção: Marco Tullio Giordana Com: Carlo De Fillippi, Nicoletta Braschi Onde: a partir de hoje no Espaço Unibanco 1 Texto Anterior: Picasso ganha mostra nos EUA em 97 Próximo Texto: 'Nerolio' pratica perversão Índice |
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