São Paulo, terça-feira, 5 de novembro de 1996 |
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Questão de competência
LUIZ CAVERSAN Rio de Janeiro - "De repente, o estampido de um tiro e o pânico geral. Eu e mais cinco pessoas saímos correndo à procura de um abrigo. Aí, senti uma quentura na minha perna. Havia sido atingida. (...) Fiquei 15 dias sem sair de casa, tive febre, não conseguia comer, muita paranóia."O depoimento reproduzido acima é da jovem Graziela Madeira, 20, uma das muitas vítimas do flagelo das balas perdidas, que percorrem os céus do Rio de Janeiro, colhendo aleatoriamente suas vítimas. As estatísticas são conflitantes: 53 vítimas este ano? Ou 20 nos últimos 15 dias? Ou há muito mais, contando aqueles que acham melhor deixar pra lá? O depoimento de Graziela, além de emprestar a necessária carga de humanidade à frieza dos números, revela em toda a sua dimensão a impotência diante do imponderável. O medo de sair de casa, infelizmente, não acomete apenas as vítimas, como Graziela. Contagia, hoje, muito mais gente do que se pensa. E é um desses cidadãos, acossado em sua fragilidade, que levanta a questão: as balas perdidas do Rio refletem toda a incompetência da polícia em localizar, identificar e prender os responsáveis. A grande maioria dos casos de balas perdidas ocorrem nas cercanias -senão no próprio interior- das favelas em que há conflito entre traficantes. São esses traficantes beligerantes, portanto, que devem ser prioritariamente combatidos. A polícia diz que faz isso. Mas faz pouco e de maneira insatisfatória. Não se trata de perseguir bandidos pelas ruas, sem saber quem são e para onde vão. Os traficantes estão em suas favelas e lá são conhecidos. Prendê-los é questão de vontade e competência. Tudo indica que, se há uma, não há a outra. Texto Anterior: As razões de Jatene e de FHC Próximo Texto: Capitalismo desregrado Índice |
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