São Paulo, sexta-feira, 8 de novembro de 1996
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"Tem gato na tuba", afirma Weffort

CYNARA MENEZES
DA SUCURSAL DE BRASÍLIA

O ministro da Cultura, Francisco Weffort, ficou irritado com a polêmica criada por sua idéia de acabar com a suposta "desigualdade" de oportunidades para as indústrias fonográficas nacional e internacional no mercado brasileiro.
"Tem gato na tuba, algum coelho morto nessa cartola", disse Weffort à Folha, criticando as declarações dos representantes de gravadoras de que o setor vai bem e não necessita da intervenção governamental.
Weffort reafirmou sua impressão de que há mais música estrangeira do que brasileira nas rádios, apesar das listas das mais ouvidas no Rio e em São Paulo mostrarem o contrário. "Ouço no rádio, no Brasil, menos música brasileira do que nos Estados Unidos ouvia música norte-americana", disse.
O ministro mostrou ser simpático à idéia francesa de garantir um percentual mais alto de execução de músicas nacionais nas rádios e disse que vai continuar os estudos sobre a música brasileira, "gravadoras gostem ou deixem de gostar".
*
Folha - O senhor falou em medidas para proteger a música brasileira, mas parece que nem gravadoras nem músicos parecem muito interessados.
Weffort - Eu não propus medida protecionista para a indústria. O que propus é que se discuta, que se examine a difusão da música pelas rádios no Brasil, porque eu morei dois anos nos Estados Unidos e eu ouvia muito mais música norte-americana lá do que ouço música brasileira no Brasil. É isso.
Folha - O senhor se refere a qualquer tipo de música?
Weffort - Qualquer tipo. Acho que isso tem de ser considerado. Agora, não estou propondo medida nenhuma. Algumas pessoas já radicalizam a discussão e começam a falar em reserva de mercado, em medidas de proteção, mas falam por conta própria, eu não tenho nada com isso.
O que estou dizendo é que não sou surdo e que, quando ando de automóvel, ligo o rádio e ouço, estando no Brasil, menos música brasileira do que quando estive nos Estados Unidos ouvia música americana.
Então, eu acho que nós temos que conversar sobre isso, uma maneira de medir a difusão dessas músicas.
Folha - A Folha comprovou que as dez músicas mais executadas em São Paulo são nacionais; no Rio, só uma é estrangeira. Contraria um pouco o que o senhor fala, não?
Weffort - Não contraria nada, porque tem muito lixo importado que não pega nem aqui nem na China e o rádio difunde. O que você está me dizendo é que o povo brasileiro, apesar de as rádios difundirem muita música vagabunda, tem um bom critério cultural e escolhe uma música melhor.
Folha - Existe uma comissão que já pretende taxar os discos estrangeiros, cobrando 30% na entrada no país...
Weffort - Como é que a comissão pode taxar? A comissão não pode taxar nada. Isso não existe. O que existe lá é um grupo de estudos sobre a música, como existe sobre museus, artes plásticas, patrimônio. Isso é inteiramente normal. E podem existir propostas as mais diferentes nessa área.
Eu começo a ficar preocupado com essa história da difusão de música pelas rádios por causa da resistência que estou observando. Eu acho que tem gato na tuba, algum coelho morto nessa cartola. Porque tem muita gente reagindo sem propósito.
Eu digo: "Precisamos estudar o assunto", e as pessoas partem para o ataque como se houvesse alguma proposta querendo controlar ou estabelecer constrangimentos. Não há nenhuma.
Folha - Foi dito que o senhor estaria tentando ocultar, com essas idéias, o lado neoliberal pós-PT.
Weffort - Não tem nada de neoliberalismo. A França, que é um país que assume sua dignidade cultural, estabelece um critério pelo qual, nas rádios francesas, você pode difundir a música não-francesa e não-européia até um certo percentual. Se eles assumem isso, por que nós não?
Eu não estou propondo que se faça necessariamente assim, estou dizendo que esse assunto seja estudado. Não me venham dizer que o público consome 60% de música brasileira que eu sei disso.
O que estou falando é que entro no carro, ligo o rádio, praticamente todo dia, e ouço uma proporção de música estrangeira que, estando nos Estados Unidos, não ouvia.
Folha - Mas e essa proposta dos 30%? As distribuidoras dizem que não aguentam mais impostos.
Weffort - Eu não vou falar de uma proposta que eu não sei nem de quem é, isso é conversa fiada. Existe uma expressão em espanhol que diz 'sangrarse en salud' -quando você está querendo esconder alguma coisa, começa a manifestar que tem alguma doença. Não significa nada, não tem nada, não há proposta nenhuma. Eu vou estudar esse tema, as gravadoras gostem ou deixem de gostar, e vou tirar as minhas conclusões.
Folha - É que está na pauta da reunião de amanhã da comissão essa história dos 30%.
Weffort - A comissão tem o direito de propor o que bem entender. Eles estão fazendo um estudo e estão fazendo sugestões. Simplesmente isso.

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