São Paulo, sexta-feira, 15 de novembro de 1996
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Cotas para negros na universidade

ANTONIO JUNQUEIRA DE AZEVEDO

A Constituição dispõe que o ensino será ministrado com base no princípio da "igualdade de condições" para acesso e permanência na escola; no entanto, dando aulas há 28 anos na Faculdade de Direito da USP, para, em média, 250 alunos por ano, e tendo tido aproximadamente 7.000 alunos, dou meu testemunho de que nem cinco eram negros!
Eis a questão: o que destrói a igualdade entre os cidadãos, o fato de não ingressarem negros numa universidade mantida com dinheiro público ou a regra que lhes reserve cota de 10% nos cursos dessa universidade? (Pelas cotas há um projeto, defendido por um "pugilo de bravos", negros e negras da USP, em organização nada oficial, o "Comitê Pró-Cotas".)
Os juristas que tendem a interpretar a igualdade perante a lei como igualdade formal dirão que as cotas, exigindo menos de alguns, subvertem a livre concorrência; os que, inversamente, procuram a igualdade substancial dirão que o sistema é injusto e precisa mudar.
O artigo 5º da Constituição determina que "todos são iguais perante a lei, sem distinção de qualquer natureza", mas está generalizada, por influência de Rui Barbosa, a idéia de que o princípio da igualdade não consiste em tratar de forma igual aos desiguais. A lei é instrumento para a justiça, e, por isso, a Constituição não permaneceu cega às diferenças. É ela que, depois de determinar a igualdade entre homens e mulheres, distingue-os, por exemplo, para efeitos de aposentadoria; é ela que distingue as pessoas também pela idade e ora exige, para certos cargos, limite mínimo, ora máximo.
Os tribunais admitem pacificamente pré-requisitos para concurso, até mesmo dando preferência a quem veio da escola pública, diante de quem veio da escola particular. Percebe-se, pois, contra possíveis excessos de juristas normativistas, que o princípio da igualdade não é de rigidez procustiana.
Cumpre esclarecer: a) 90% das vagas continuariam disputadas normalmente, e somente 10% iriam para concorrência entre candidatos afro-descendentes; b) ninguém seria obrigado a se apresentar para o vestibular pelas cotas (o que respeita a liberdade individual); e c) as cotas teriam vigência de 25 anos, e, depois, far-se-ia uma revisão da regra.
Por fim, a questão sobre "quem é afro-descendente": seriam considerados afro-descendentes todos os que assim se autodeclarassem, isto é, todos que, independentemente da cor, se inscrevessem para o vestibular no grupo das cotas -somente após os resultados é que, se houvesse dúvida, o aprovado seria, a seu risco, investigado.

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