São Paulo, domingo, 17 de novembro de 1996
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Argentina, México e Brasil

CELSO PINTO

Desde que o México quebrou, em dezembro de 1994, arrastando consigo a Argentina, abriu uma oportunidade rara no debate econômico. Para sair de uma mesma confusão, o México passou por uma forte desvalorização cambial, enquanto a Argentina sustentou seu câmbio fixo.
Para o Brasil, que hoje está no meio do caminho, com um câmbio flexível mas sobrevalorizado, é interessante observar quem se sairá melhor.
Existe uma polêmica ainda em aberto sobre as razões da crise mexicana, mas o fato é que, frente a um buraco nas contas externas de 7% do PIB em 94 e a uma fuga em massa de dólares, que esgotou as reservas, o México não teve outra opção senão deixar flutuar sua moeda. O peso chegou a perder mais de 100% do valor numa questão de meses. A economia despencou: o produto caiu 6,2% em 1995, os salários reais caíram pela metade, o desemprego explodiu.
A recuperação no balanço de pagamentos, de todo modo, foi notável. Já no ano seguinte à crise, 1995, o déficit externo caiu para apenas 0,3% do PIB, e as reservas cambiais subiram para US$ 15,7 bilhões. Uma herança desastrosa deixada foi a retomada da inflação para 52% em 95, depois de anos de esforços para consolidar o índice em apenas um dígito anual.
Já a Argentina, atingida pela crise mexicana, não tinha outra opção senão manter seu regime de conversibilidade, com câmbio fixo. Como houve fuga de dólares e, neste sistema, a moeda só pode crescer quando há aumento de reservas, o resultado foi uma forte contração na economia. O produto despencou 4,6% em 95, o que acabou levando a uma deflação, ou seja, queda nos preços e salários. A inflação fechou o ano em 1,6%.
A combinação entre queda de preços e recessão ajudou a balança comercial e o déficit no balanço de pagamentos argentino, que havia sido de 3,3% do PIB em 94, caiu para apenas 0,9% do PIB em 95. As reservas fecharam o ano em US$ 15,9 bilhões.
Os dois países se ajustaram rapidamente ao desequilíbrio externo e, depois de uma recessão, começaram a se recuperar neste ano.
O México surpreendeu os analistas em meados do ano, pelo vigor da expansão econômica, puxada, num primeiro momento, pelas exportações, ajudadas pelo câmbio. As estimativas são de que o PIB deverá crescer algo em torno de 4% este ano. A inflação, por sua vez, poderá cair para algo em torno de 25% ao ano.
Os investidores internacionais voltaram, mas ficaram incertezas. De um lado, muitos criticaram a tentativa do governo mexicano de, mais uma vez, tentar segurar o câmbio e, com isso, obter ganhos inflacionários mais rápidos. Recentemente, o peso esteve sob ataque e perdeu valor. A meta do governo é combinar, em 97, um crescimento de 4% com uma inflação de 15%.
A Argentina também se recuperou este ano: o crescimento pode ficar entre 3% e 4% e a inflação, em apenas 1%, e o déficit externo está sob controle. Para 97, o governo imagina um crescimento de até 5%. O mercado está cético e alguns projetam não mais do que 2,5%.
Os defensores do câmbio flexível argumentam que o México tem mais chances de retomar um crescimento sustentável a médio prazo: a inflação cairá lentamente mas, em compensação, mantido um câmbio realista, não se acumulariam pressões nas contas externas no futuro.
Domingo Cavallo, ex-ministro da Fazenda da Argentina, discorda. Acha que o México voltou à armadilha da inflação alta e que não conseguirá sair dela, porque não terá fôlego político para isso. A pressão por maior crescimento comprometerá o esforço antiinflacionário, num círculo vicioso conhecido. Em contrapartida, diz ele, a Argentina conseguirá manter um crescimento sustentável alto, com garantia de inflação baixa.
Os críticos do câmbio fixo argentino, ao contrário, acham que a Argentina colocou-se numa armadilha de inflação baixa, onde os ajustes da economia sempre têm que ser feitos às custas de deflação, queda de preços e salários, o que é politicamente muito difícil. Curiosamente, as duas críticas vêem barreiras políticas como cruciais.
O futuro dirá quem tem razão. Até lá, parece ter sido sábia a decisão brasileira de optar por um câmbio flexível.

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