São Paulo, domingo, 17 de novembro de 1996
Texto Anterior | Próximo Texto | Índice

Para argentinos, Mercosul é político

GILSON SCHWARTZ
DA EQUIPE DE ARTICULISTAS

Para os argentinos, o Mercosul assume cada vez mais um significado político, de política exterior e não apenas de integração comercial. A "politização" do Mercosul vem ocorrendo entre acadêmicos, empresários e governo argentino.
Essa tendência pode ser detectada no discurso de autoridades como o novo embaixador argentino no Brasil, citado por Clóvis Rossi em sua coluna, que dá ênfase ao avanço das iniciativas militares conjuntas. E o incidente em torno do estudo do Banco Mundial, que acusa o Mercosul de protecionismo a indústrias ineficientes, sugere que o projeto de integração regional já incomoda mais do que seria de imaginar.
Na semana que vem será defendida uma dissertação de mestrado na Universidade de São Paulo que explora esse lado pouco conhecido dos brasileiros, a visão do Mercosul que está sendo elaborada pelos argentinos. Há vários estudos sobre o processo de integração e mesmo sobre a percepção dos empresários brasileiros, em geral mostrando que ela ainda é débil. Mas o trabalho que Janina Onuki vai apresentar ao departamento de Ciência Política da USP avança em território relativamente inexplorado. Se para os brasileiros o Mercosul ainda é algo distante, mais longínquo ainda é o universo de opiniões dos argentinos sobre o projeto regional. A defesa da tese acontece no próximo dia 22.
Uma das conclusões interessantes de Onuki é que na Argentina a integração não é apenas regional, mas uma integração entre as várias áreas e setores interessados no processo. Há então "uma clara diferença entre as atitudes brasileira e argentina no que se refere à condução do Mercosul".
Diplomatas, empresários e técnicos setoriais amadurecem as pautas de negociação em conjunto. O Mercosul tornou-se de fato uma prioridade do governo argentino. É um tipo de abordagem especialmente relevante agora que se discutem mais os resultados econômicos surpreendentes do Mercosul e surgem reações preocupadas em órgãos como o Bird.
Câmbio e integração
Talvez seja cada vez mais difícil diferenciar o Mercosul "econômico" do projeto político regional.
A rigor, a história do Mercosul sempre foi marcada por impulsos políticos, esteve associada à democratização na região e respondeu a desafios de negociação e estratégia nas relações globais.
Em algum momento na transição do primeiro para o segundo mandato de Carlos Menem houve uma mudança de ênfase e os Estados Unidos ou o Nafta deixaram de ser prioridade absoluta. Talvez o estímulo tenha sido a coincidência do final do mandato de Bill Clinton e o começo do mandato de Fernando Henrique Cardoso.
Os problemas de consistência macroeconômica foram por muito tempo apontados como um obstáculo importante ao aprofundamento do Mercosul. Mais de dois anos depois do Plano Real, entretanto, parece mais razoável apostar na convergência entre a inflação na Argentina e no Brasil.
Temia-se uma catástrofe no dia em que Cavallo saísse do governo argentino. Ela não aconteceu. Se o amadurecimento político do Mercosul prosseguir, a convergência entre políticas cambiais também poderá deixar de ser algo absurdo.

Texto Anterior: Aumentar a poupança privada
Próximo Texto: Salvaguarda a brinquedo continuará
Índice


Clique aqui para deixar comentários e sugestões para o ombudsman.


Copyright Empresa Folha da Manhã S/A. Todos os direitos reservados. É proibida a reprodução do conteúdo desta página em qualquer meio de comunicação, eletrônico ou impresso, sem autorização escrita da Folhapress.