São Paulo, segunda-feira, 18 de novembro de 1996
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Harnoncourt não busca volta ao passado

CLÁUDIA TREVISAN
DE NOVA YORK

O regente austríaco Nikolas Harnoncourt, 66, está convencido de que é impossível reproduzir exatamente os sons concebidos por compositores clássicos, mesmo com instrumentos originais.
"Eu nunca tive a idéia ou o objetivo de repetir a performance de tempos passados. Isso não faria nenhum sentido", afirmou Harnoncourt em entrevista coletiva concedida em Nova York.
Pioneiro no resgate de instrumentos originais, uma pesquisa que iniciou em 1953, o músico se encontra em Nova York para reger o ciclo completo de sinfonias de Beethoven com a Orquestra de Câmara da Europa.
Ao todo, serão cinco concertos, todos no Carnegie Hall. Os dois primeiros já foram realizados no final de semana. O último está marcado para sábado.
É a primeira vez que Harnoncourt rege uma orquestra no Carnegie Hall. "É engraçado fazer a minha estréia nessa idade."
A seguir, os principais trechos da entrevista de Harnoncourt.
*
Pergunta - Como o sr. se convence de que o som que o sr. encontra em sua pesquisa de instrumentos originais é o som que o compositor pretendia usar?
Harnoncourt - Eu estou absolutamente convencido de que não é o mesmo som. Porque o que está acabado está acabado. Como é impossível consultar os próprios compositores, você nunca pode saber como soava exatamente um instrumento antigo.
Eu sei que há pessoas dogmáticas em meu campo, que pensam que quando elas tocam uma peça em instrumento original ele soa como ele teria soado séculos atrás. Mas isso é ridículo, é impossível.
Eu estou interessado nos instrumentos porque eles são as ferramentas, a ajuda para trazer o balanço, os sons e as cores.
Pergunta - Como é o seu processo de pesquisa de instrumentos originais?
Harnoncourt - Eu faço tudo pessoalmente. Eu não acredito em ninguém. Só há uma coisa que realmente pode ensinar-nos algo, são os próprios instrumentos. E nós temos vários instrumentos, começando de 1450, 1480, até hoje.
Há instrumentos de todas as épocas e eu tenho instrumentos de 1500, 1570, até hoje. Se os diretores dos museus que possuem esses instrumentos colaboram, você pode estudá-los, medi-los, tocá-los.
Tocar os instrumentos é o mais importante. Há uma série de descobertas curiosas. Uma delas é que não há desenvolvimento.
Se você pegar um oboé de 1720, com duas chaves, você pode fazer tudo o que é necessário. É um instrumento perfeito para determinada música. Se você o quer mais alto, você tem de mudar alguma coisa. Se você quer mais possibilidades cromáticas, você tem de mudar alguma coisa.
Mas você tem de pagar por cada mudança. Se você adicionar chaves, você adiciona algumas qualidades, mas perde outras. E essa é a grande experiência que eu tive em toda a minha pesquisa. Ela se tornou a minha filosofia de vida.
Pergunta - O que o sr. ainda não fez em sua carreira musical que o sr. ainda quer fazer?
Harnoncourt - Eu ainda tenho de fazer as óperas de Alban Berg (compositor vienense; 1885-1935), "Lulu" e "Wozzeck".

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