São Paulo, sábado, 23 de novembro de 1996
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"Morus e seu Carrasco" investe no tradicional

NELSON DE SÁ
DA REPORTAGEM LOCAL

Renato Gabrielli, o jovem autor de "Morus e seu Carrasco", não é novidade em São Paulo. Um autor da nova dramaturgia italiana, começou a escrever no fim dos anos 80 e foi apresentado aqui na entrada dos 90, com "Lettere alla Fidanzata".
Dirigida por Maurício Paroni de Castro, brasileiro baseado em Milão, a peça, adaptada de cartas de Fernando Pessoa, mostrou-se de envolvente lirismo. Estava ali, certamente, uma bela revelação de autor, delicado nas imagens românticas, de registro sereno.
"Morus e seu Carrasco" é bem diversa. É um espetáculo tradicional, como admite o diretor, Gianni Ratto, no programa. Tem personagens tradicionais, com alguma aventura pelo teatro épico brechtiano no protagonista, sem alcançar, e até evitando, a poesia da peça anterior.
Apesar do tema -o conflito pessoal de Thomas More diante dos desmandos de Henrique 8º, rei da Inglaterra-, é de características mais próprias ao teatro popular italiano. É uma comédia com direito a traços de Eduardo de Filippo, como na cozinheira e no próprio carrasco.
(Na direção, com Gianni Ratto, remanescente do TBC e da invasão italiana dos anos 50, a peça está mais para Silvio D'Amico, o crítico cujo impacto na cena brasileira daquele período ainda não foi devidamente reconhecido.)
O tom cômico dos diálogos se estende pela peça toda, abrangendo o próprio e venerável Thomas More. "Seu marido sabe o que dar a você", diz ele. "Amor?", pergunta a amada Jane. "Latim. Latim e latim", responde More, como em alguma comédia de costumes.
Rigoroso, incorruptível, More (1478-1535) foi dos primeiros sinais do Renascimento fora da Itália. Defendia a reforma interna na Igreja Católica, não o cisma de Henrique 8º. Pagou pelas idéias e pelo rigor, mas também pela proximidade com o rei, de quem chegou a ser chanceler.
Na peça, lembra Galileu do texto de Brecht, com sinal trocado, aqui em defesa da Igreja, diante do poder crescente dos reformistas. Mas também em dúvida, humanamente dúbio diante da fascinação do poder -e das exigências materiais, de proteção da família.
É uma dramaturgia que exigia mais da encenação, até da simples marcação. No elenco, necessitado de aprofundamento, surgem com algum destaque Ariel Moshe e Lara Córdula. Sublinhados pela cenografia, por demais despojada, os figurinos de Fábio Namatame são também tradicionais.

Peça: Morus e seu Carrasco
Autor: Renato Gabrielli Elenco: Ariel Moshe, Jorge Cerruti, Luiz Miranda, Soraya Saide e outros
Onde: teatro Ruth Escobar (r. dos Ingleses, 209, Bela Vista, tel. 289-2358)
Quando: qui a sáb, às 21h; dom, às 19h
Quanto: R$ 20 (qui, sex e dom) e R$ 25 (sáb)

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