São Paulo, sábado, 7 de dezembro de 1996
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Augusto Boal prega 'Teatro Legislativo'

ERIKA SALLUM
FREE-LANCE PARA A FOLHA

As barreiras sempre foram inimigas de Augusto Boal, que está lançando o livro "Teatro Legislativo". Em 1971, o dramaturgo e diretor revolucionou os palcos brasileiros ao criar o Teatro do Oprimido, que, entre suas teorias, pregava a destruição das divisões que separam ator e espectador, classe dominante e dominada.
Como vereador pelo PT do Rio, mergulhou fundo nesses ideais, fazendo da arte teatral uma forma de atuação política.
Durante oficinas culturais que promovia junto a comunidade de negros, mulheres, homossexuais etc., Boal foi descobrindo as necessidades da população e transformando-as em projetos de lei.
Essas experiências são contadas no livro "Teatro Legislativo", editado pela Civilização Brasileira.
O termo é uma extensão do Teatro do Oprimido, em que o espectador se transforma em ator: agora, o cidadão se transforma em legislador.
"Em vez de eu ficar trancado em meu gabinete, a população me diz quais leis devo fazer. Uso o teatro como mediação", disse Boal, em entrevista à Folha, por telefone.
Por meio de jogos teatrais com um grupo de cegos, ele descobriu, por exemplo, que era preciso construir plataformas nas bases dos telefones públicos.
Como não havia nada que sinalizasse a presença dos telefones nas ruas, os deficientes visuais frequentemente se acidentavam.
As questões surgidas durante as oficinas já renderam a aprovação de 11 projetos de lei. Entre eles, o da primeira lei brasileira de proteção a testemunhas.
Boal tentou, sem sucesso, se reeleger no último pleito. Apesar de seu mandato terminar no final deste ano, o dramaturgo e diretor pretender continuar o projeto.
"Nossa próxima etapa é encontrar uma forma de fazer o teatro legislativo sem a presença de um legislador exclusivo."
Para isso, ele já está assinando contratos com prefeituras de várias cidades brasileiras, com as quais vai trabalhar em parceria na promoção das oficinas.
Prolongamento
O Teatro Legislativo, explica Boal, é a etapa mais avançada do Teatro do Oprimido, "no sentido de que incorpora todas as demais técnicas".
Segundo ele, essa teoria surgiu quando as possibilidades de fazer um "teatro popular para a população" foram ficando cada vez mais distantes, devido aos problemas políticos e econômicos pelos quais passava a sociedade.
Por causa de suas idéias, Boal foi exilado durante o regime militar. Antes disso, no período em que foi diretor do Teatro de Arena de São Paulo, montou espetáculos marcantes, como "Arena Conta Zumbi" e "O Melhor Juiz, o Rei".
Augusto Boal dividiu o Teatro do Oprimido em cinco fases: teatro-jornal, teatro invisível, teatro-imagem, teatro-fórum e arco-íris do desejo.
Na maioria delas, o público era convidado a interagir com os atores. "Todos podem fazer teatro", conclamava.
No teatro invisível, por exemplo, um grupo de artistas armava uma cena em um local onde ela poderia ter acontecido, como um super-mercado ou um shopping center.
Suas teorias se espalham hoje por quase todos os continentes. "Isso acontece porque o Teatro de Oprimido é um método de conhecimento, não apenas uma forma de se conhecer", define.
Ele acrescenta que o público-alvo desse teatro sempre foi o oprimido, "seja qual for a opressão por ele sofrida".
Projetos
Além de "Teatro Legislativo", Boal já publicou neste ano "Arco-íris do Desejo" e "Aqui Ninguém É Burro".
Em julho do ano que vem, vai ministrar um curso de dez dias para atores da tradicional companhia inglesa Royal Shakespeare Company.
"Aplicarei as técnicas psicoterapêuticas do Teatro do Oprimido na construção de personagens. Será um trabalho bem bonito."

Livro: Teatro Legislativo
Autor: Augusto Boal
Lançamento: Civilização Brasileira
Preço: R$ 15 (150 págs.)

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