São Paulo, domingo, 8 de dezembro de 1996
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A pintura dos magos das cavernas

DO "LIBÉRATION"

Dois pesquisadores estão propondo uma reinterpretação das pinturas que os homens do paleolítico começaram a deixar nas cavernas da Europa há cerca de 30 mil anos: os autores dessas obras trabalhavam em "estados alterados de consciência".
Quer dizer: entre 35 mil e 10 mil anos, dentro dessas grutas decoradas (frequentemente galerias compridas e profundas), xamãs teriam tido visões, as quais eles teriam pintado sobre as paredes de rocha. Xamãs: a designação genérica daquele que, em sociedades ditas primitivas, se comunica com o além para curar doentes e intervir no mundo natural.
A hipótese está no livro "Chamanes de la Préhistoire - Transe et Magie dans les Grottes Ornées" (Xamãs da Pré-história - Transe e Magia nas Cavernas Decoradas"), do francês Jean Clottes e do antropólogo sul-africano David Lewis-Williams.
Clottes é a maior autoridade francesa em cavernas com paredes cobertas de imagens pré-históricas, responsável científico pelas grutas de Chauvet e conservador geral do patrimônio do Ministério da Cultura francês.
Os dois estudaram as imagens das cavernas mais famosas do final do paleolítico, como Lascaux e Gargas. Queriam saber quem produziu essas imagens e por que o fez dentro das grutas.
Consciência alterada
Há muito tempo -desde os trabalhos do pesquisador André Leroi-Gourhan e de Annette Laming-Emperaire, no começo dos anos 60- que os especialistas não tinham ousado se dedicar a uma interpretação dessas imagens de cavalos, bisões, mamutes e "bruxos", além de pontos, traços e sinais geométricos que recobrem as paredes de dezenas de cavernas da França (onde estão 95% delas) e da Espanha.
"O estado de espírito atual é hostil à idéia mesma de interpretação", constatam os autores. Eles, entanto, decidiram ir além. E chegaram a uma conclusão: no final do paleolítico, a capacidade de alterar seu estado de consciência garantia distinção a quem tinha esse dom especial de se comunicar com o além e de registrar esse conhecimento (leia texto abaixo).
Locais de transe
"A caverna é um lugar aonde se vai à procura de visões. Um local onde se pode viajar, encontrar espíritos, animais. O xamã tem a impressão que as paredes vivem", afirmam Clottes e Lewis-Williams.
Segundo os pesquisadores, o xamã considera que a rocha é uma espécie de véu entre o mundo dos espíritos e ele. Enquanto ele viaja com os espíritos do além, ele materializa suas visões por meio de um desenho, que o ajuda posteriormente a conseguir novas visões.
"O transe não é uma viagem provocada por uma droga alucinógena, como o LSD, por exemplo. Ele serve para curar os doentes, fazer chover, estabelecer a harmonia em um grupo."

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