São Paulo, terça-feira, 10 de dezembro de 1996
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Ciclo traz caos e poesia dos marginais

INÁCIO ARAUJO
CRÍTICO DE CINEMA

O grupo é amplo e, hoje, razoavelmente conhecido: Rogério Sganzerla, Carlos Reichenbach, Ozualdo Candeias, João Callegaro, Andrea Tonacci, João Batista de Andrade, João Silvério Trevisan etc. Houve outros, em outros Estados (de Júlio Bressane, no Rio, a André Luís de Oliveira, na Bahia), mas em São Paulo a noção de marginalidade foi mais clara.
Primeiro, eles se distanciaram do cinema "oficial", de produtor, invocando as noções de autor e produção independente.
Em seguida, afastaram-se do cinema novo, buscando uma brasilidade mais visceral e menos intelectual (matéria em que José Mojica Marins, o Zé do Caixão, foi uma espécie de guia).
Também trocaram, não raro, a influência européia pela americana (é verdade que a partir da nouvelle vague francesa). Nessa linha, vários deles buscaram criar um cinema ostensivamente popular.
Mas o que aproxima as diversas buscas é, em grande parte, a situação do Brasil na época. O olhar ora niilista, ora anarquista criou filmes em que banditismo, desespero, humor cafajeste, "nonsense" e caos terminaram compondo uma poética árida e desigual.
Eram formas de significar um momento em que as esperanças políticas do início dos anos 60 haviam se esboroado. Vigoravam o AI-5 e uma forte censura.
A desigualdade dos filmes é tão evidente quanto a diversidade dos destinos de seus diretores. Rogério Sganzerla, que começou a carreira de forma fulgurante, apagou-se aos poucos. João Callegaro trocou o longa pelo cinema publicitário. João Silvério Trevisan virou romancista etc.
O menos conhecido, entre os melhores do ciclo, é "O Pornógrafo" (1970), de João Callegaro: filme brilhante, com apelo popular, mas feito em preto-e-branco e lançado no exato momento em que o exibidores passaram a exigir apenas filmes coloridos.
Há os óbvios, como "A Mulher de Todos", de Sganzerla (1969), ou "Meu Nome É Tonho" (1969), possivelmente o melhor trabalho de Candeias. Há os quase desconhecidos, por diversas razões: "Hitler no Terceiro Mundo" (1969), de José Agrippino de Paula, "Bang Bang" (1970), de Tonacci, "O Despertar da Besta" (1968), de Mojica Marins.
Uma curiosidade segura são os episódios de Carlos Reichenbach em "As Libertinas" (1968) e "Audácia" (1970): provas de que se pode começar a carreira com escrita vacilante e evoluir com força e consistência, quando o que a orienta é a paixão pelo cinema. Esta paixão é, no mais, o princípio e a marca de boa parte dos filmes a serem exibidos no ciclo.

Ciclo: Cinema Marginal Paulista
Quando: de hoje a 15 de dezembro
Onde: Sala Cinemateca -acompanhe programação no roteiro do Acontece

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