São Paulo, quarta-feira, 11 de dezembro de 1996
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Portugueses lêem cartas de amor a Pessoa

JAIR RATTNER
DE LISBOA

Ofélia Queirós foi o grande amor de Fernando Pessoa, o maior poeta português deste século. A relação, vivida por meio de cartas e encontros furtivos, pode ser acompanhada no livro "Cartas de Amor de Ofélia a Fernando Pessoa", publicado em Lisboa.
Apesar de serem apenas dois períodos curtos de namoro -o primeiro entre março e novembro de 1920 e o segundo entre 1929 e 1930-, Ofélia chegou a escrever 230 cartas, 46 cartões, bilhetes e dois telegramas. Mesmo depois de acabado o namoro, ela continuou escrevendo por quase dois anos.
Foram escolhidas as cartas que melhor ajudam a entender o poeta, a maior parte respondendo às de Pessoa, publicadas no livro "Cartas de Amor de Fernando Pessoa".
Doze anos mais nova que Pessoa, Ofélia conheceu o escritor quando foi trabalhar como secretária na empresa Felix, Valladas & Freitas, em que Pessoa e seu primo, Mário Nogueira de Freitas, eram sócios.
Quando Ofélia começou a namorar Pessoa, ela tinha um pretendente -Eduardo- que já havia visitado a família, condição para oficializar o namoro.
Quando termina com Eduardo, este vai se queixar ao pai de Ofélia, dizendo que ela estaria se encontrando furtivamente com outro.
Na primeira fase do namoro, Pessoa recusou-se a visitar a família de Ofélia. "Ele justificava dizendo que por ter sido criado no estrangeiro tinha uma maneira de viver diferente da dos portugueses", diz Maria da Conceição.
Segundo Maria da Conceição, Ofélia aceitou uma maneira diferente de viver o namoro. "Nas cartas há referências a beijos, o que era muito avançado, o namoro foi sempre às escondidas. Ela aceitava encontrar-se com ele na rua, fingindo coincidência no bonde ou no caminho para a professora de francês.".
A família de Ofélia dividia-se. O pai era contra o namoro, mas a irmã e a mãe eram suas cúmplices e confidentes. Nas duas fases do namoro, Pessoa rompe afirmando que deveria dedicar-se a sua obra.
A segunda fase começa depois que o escritor Carlos Queirós, sobrinho de Ofélia e amigo de Pessoa, traz para casa a famosa foto do poeta tomando um copo de vinho numa taberna, com um trocadilho de Pessoa: "Em flagrante delitro".
Pessoa, numa de suas cartas, afirma que se não se casasse com Ofélia não se casaria com mais ninguém. Ela casou em 1935, no ano da morte de Pessoa.
Heterônimos
"Álvaro de Campos escreveu uma carta a Ofélia em que se refere em termos antipáticos a Pessoa, chamando-o de abjeta criatura", conta Maria da Conceição.
Os outros dois nomes que aparecem nas cartas são Íbis e o senhor Crosse, o charadista. Na intimidade, Fernando e Ofélia chamavam-se de Ibisinho e Ibisinha.
Era com o nome de Crosse que Pessoa participava de concursos de charadas. Em uma das cartas, Ofélia diz que ia rezar para que Crosse acertasse um prêmio grande, o que permitiria a Pessoa ter uma vida desafogada e casar.

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