São Paulo, sexta-feira, 20 de dezembro de 1996 |
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'Pinocchio', o filme, foge do desenho da Disney
INÁCIO ARAUJO
Em vez de tomar o clássico desenho como base, seus produtores procuraram, na medida do possível, distanciar-se dele. Em vez de disfarçar o uso de efeitos especiais, o filme enfatiza-os, de modo a criar uma nítida distinção entre a natureza do boneco com vida e a dos humanos que o cercam. Em lugar de pôr em surdina a origem do boneco -fruto do amor frustrado de seu criador, Geppetto, e, portanto, de sua solidão-, toda a fantasia erótica depositada no boneco é evidenciada (o nariz de Pinocchio, cada vez que cresce, quando o boneco mente, beira o obsceno). Omissão No mais, filme também evita falar na fada que dá vida ao boneco de madeira. Estranha omissão, que cria um vácuo de dupla natureza na trama: ela é realista, porque suprime da fábula um elemento básico de magia; ao mesmo tempo é artificial, já que, na falta de fada para dar vida a Pinocchio, a única coisa capaz de animá-lo é um arbítrio, isto é, o próprio cinema. Esse desvão entrega toda a ideologia do filme, que consiste em identificar o espetáculo cinematográfico à magia. Ideologia bem da Hollywood atual (embora a produção seja européia), que consiste em ver no espetáculo um fim em si, e não um veículo onde a magia das coisas vem se depositar. É graças a isso, em todo caso, que o filme de Steve Barron ("As Tartarugas Ninja") transita com desenvoltura entre fábula e realidade, já que consegue unir essas duas instâncias sob o primado do cinema. Odediência e submissão Dito isso, aqui a clássica história de Carlo Collodi continua a girar em torno do caminho que Pinocchio tem de trilhar para se tornar um "menino de verdade". Esse caminho, em resumidas contas, é o da obediência e da submissão aos adultos. Nesse particular, a atual versão fica bem próxima da de Disney (e bem longe da realizada em 1972 por Luigi Comencini -tida na Europa como um clássico- em que cada aventura do boneco "cabeça de vento" é vista como uma experiência, um gesto de rebeldia que, afinal, o conduz à plena humanidade). Em outros pontos, este novo "Pinocchio" afasta-se de Disney. O principal deles: Pinocchio é uma história de terror. Perder-se de casa, ser ingrato com os pais, sofrer metamorfoses dolorosas, ser sequestrado são fantasias infantis angustiantes que essa história desenvolve. A versão Disney enfrenta esse aspecto francamente soturno da história desse boneco-menino mentiroso. Na realizada por Barron, esse aspecto é bem mitigado, o que talvez resulte em frustração para aquelas crianças que buscam vivenciar suas angústias e terminam por receber, em troca, um triunfo do aparato técnico. Apesar desses limites, "As Aventuras de Pinocchio", o filme, é uma diversão digna para a criançada. Filme: As Aventuras de Pinocchio Produção: 1996, 95 minutos Direção: Steve Barron Com: Martin Landau, Geneviève Bujold e Jonathan Taylor Thomas Quando: a partir de hoje, nos cines Lumière 2, Butantã 1 e 2, Olido 1, Liberty e circuito Texto Anterior: Auto de Natal revive centro Próximo Texto: Sete exposições terminam hoje em SP Índice |
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