São Paulo, segunda-feira, 23 de dezembro de 1996
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O bem e o mal do PT

LUÍS NASSIF

Neste ano da graça de 1996, o mal maior do PT já foi seu maior bem: Luiz Inácio Lula da Silva.
Lula, o primeiro operário a se candidatar à Presidência da República, o homem que simbolizou a luta do meio sindical contra o peleguismo, o mais expressivo representante da sociedade civil na luta contra o regime militar, o trabalhador que trouxe uma lufada de caráter ao ambiente político e à elite social brasileira, ficou irremediavelmente preso aos anos 80.
Não aprendeu novos conceitos, não conseguiu se desvencilhar de velhos valores e, com um estilo acomodatício que lembra em tudo a contemporização existente nos partidos convencionais, impediu o deslanche do partido ao não se mostrar capaz de conduzir a travessia e não permitir o surgimento de outras lideranças nacionais.
Há um lado do PT que representa o fato político mais relevante surgido nos anos 90. E outro que carrega o que de mais atrasado existe na vida nacional.
O PT moderno ganha eleições, firma compromissos com a cidadania e implementa o mais relevante avanço da história política brasileira: o início do controle público, não político, sobre o Estado, por meio de mecanismos como o orçamento participativo e conselhos gestores.
O outro PT continua a brandir um radicalismo estéril. Não tem votos, não tem imaginação e não tem desprendimento. Seu único objetivo são os cargos e benesses do poder. Só sobrevive porque vive parasitariamente do PT moderno.
O grave é que é esses setores passaram a ser estimulados dentro do partido como peça da estratégia de sobrevivência política de Lula contra as novas forças.
Represálias
Não há prefeitura petista bem-sucedida que não tenha sido bombardeada por esse jogo. O que ocorre hoje em dia com o prefeito de Porto Alegre, Tarso Genro, é prova disso.
Genro é, de longe, a mais brilhante estrela das esquerdas. Intelectual de peso, não só ajudou a construir os princípios que vão orientar as esquerdas daqui para a frente como demonstrou liderança, competência política e administrativa invejáveis. Seria candidato certo ao governo gaúcho -com vitória garantida.
Para abrir espaço para sua facção, no entanto, grupos ligados a Lula passaram a veicular que Genro seria um presidenciável.
Deram um tiro no próprio pé. O nome de Genro passou a se consolidar nacionalmente como candidato natural à sucessão de Lula.
Esse corte permitiria entronizar Lula definitivamente como símbolo maior do partido. Mas Lula não ambiciona mudanças e não admite a aposentadoria. E, com isso, impede que o partido deslanche.
Dentro dessa estratégia de sobrevivência, nos últimos tempos permitiu a veiculação das teses mais estapafúrdias -como o PT oferecendo um vice à candidatura de Itamar Franco ou apoiando o governador paranaense Jaime Lerner. Aparentemente, Lula não consegue admitir que o PT possa ser bem-sucedido sem ele. O operário que corria riscos em nome de uma bandeira não mais existe.
A bandeira única de Lula chama-se Lula. E a barreira maior para o PT se firmar como o grande partido nacional chama-se Lula.

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