São Paulo, sexta-feira, 27 de dezembro de 1996
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Encurralados pelo desenvolvimento

ANTONIO SILVEIRA R. DOS SANTOS

Ignorados por culturas e países dominantes, os últimos povos indígenas da região amazônica e, talvez, os últimos "povos da floresta" estão desesperados, enfrentando o maior dos desafios: preservar os seus últimos recursos territoriais e barrar o avanço da devastadora e insensível civilização dos não-índios, como eles nos denominam.
Estimados em 42 milhões à época do descobrimento, quase o mesmo número de europeus, restam hoje apenas alguns milhares. Após terem vivido em harmonia com os recursos naturais, viram o início de seu declínio como nação, pois, no correr desses quatro séculos, milhões foram mortos pelos conquistadores em busca de ouro e pela ganância sobre suas terras. A busca das riquezas de suas madeiras, no final deste século, dizimará o restante deles, pois sem suas florestas não sobreviverão.
Só na primeira metade deste século, o Brasil perdeu 87 tribos, segundo o Worldwatch Institute. No mundo, um terço dos idiomas norte-americanos e dois terços dos australianos desapareceram desde 1800, e há poucos anos mais de 100 mil indígenas foram exterminados na Guatemala.
Devido à falta de proteção legal concreta na quase totalidade dos países, à ganância por seus recursos naturais, à falta de informação de sua riqueza cultural, ao seu status de inferioridade, ao esgotamento dos recursos naturais dos países desenvolvidos e, ainda, à expansão demográfica e industrial de nossa civilização, os povos da floresta estão sendo obrigados a grandes deslocamentos territoriais, fazendo com que procurem refúgio nos "confins do mundo". Agora encontram-se encurralados e sem saída.
Seus direitos foram discutidos na Conferência sobre Desenvolvimento e Meio Ambiente, a Rio-92, bem como foram objeto de estudos e recomendações na 2ª Conferência Mundial de Direitos Humanos, de Viena, 93, incluindo-os no grupo dos vulneráveis. Há muitas ONGs trabalhando para sua preservação, além do que o artigo 231 de nossa Constituição reconhece as culturas indígenas e determina sua proteção pela União. Mas pouco foi feito para preservá-los.
Sem conscientização das autoridades competentes, sem vontade política e uma legislação realmente protetora e sua efetiva aplicação, os últimos grupos indígenas brasileiros estarão cada vez mais encurralados e fatalmente serão exterminados pela ganância desenvolvimentista, o que será uma perda inestimável para a humanidade.

Antonio Silveira Ribeiro dos Santos, 45, juiz de direito, é criador do programa ambiental A Última Arca de Noé, associado ao Pnuma - Programa das Nações Unidas para o Meio Ambiente.

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