São Paulo, domingo, 29 de dezembro de 1996
Texto Anterior | Próximo Texto | Índice

Novo prefeito quer acabar com abrigos

DA REPORTAGEM LOCAL

Santos tem um desses índices que encantam a classe média: as crianças da cidade têm menos dentes cariados ou podres que as do Japão, Itália e França.
A criança santista de 12 anos tem 1,7 dente estragado. Japoneses, italianos e franceses da mesma idade têm 3,6, 2,2 e 2,1, respectivamente.
O prefeito atual, David Capistrano (PT), diz que a cidade chegou a esse estágio porque não se preocupou só com dentes.
O programa para as crianças prevê um atendimento integral, que vai da escola à saúde, das meninas prostitutas aos garotos viciados em crack -e chega à família.
Foi por esse motivo -a integralidade- que Santos ganhou prêmios do Unicef (Fundo das Nações Unidas para a Infância) e da Organização Mundial de Saúde.
O prefeito eleito, Beto Mansur (PPB), pensa diferente. Diz que manterá o sistema de saúde, chamou uma petista para a secretaria de Assistência Social, mas vai acabar com os albergues porque eles atraem miseráveis à cidade.
"Mendigo e menino de rua em Santos recebem café da manhã, almoço, jantar e cama para dormir. Vou desmontar esse sistema assistencialista. Vou ensinar a pescar, não vou dar o peixe", afirma.
Será o fim do programa, diz o prefeito atual, David Capistrano (PT). "Não tem sentido manter o programa de saúde e desmantelar o resto. Saúde não depende só de serviços de saúde. Depende de educação, de atendimento social".
Choque
Estão em choque em Santos duas correntes antagônicas no modo de administrar uma cidade: a do PT, que prioriza questões sociais, e a do PPB, que põe obras na frente.
Tal qual Paulo Maluf, Mansur diz que suas prioridades são construir um túnel e erguer prédios do projeto Cingapura em favelas.
O programa do PT para as crianças de Santos teve sucesso por duas razões, segundo Capistrano: continuidade e prioridade.
O PT está à frente da prefeitura desde 1988 e as questões ligadas à criança foram priorizadas no orçamento. Neste ano, elas consumiram cerca da metade dos R$ 287 milhões que a cidade gastou.
Esse dinheiro é distribuído a seis secretarias: Saúde, Educação, Assistência Social, Habitação, Esporte e Cultura -as duas primeiras são prioritárias.
Na área de saúde foram criadas 22 policlínicas, nas quais há atendimento médico, acompanhamento nutricional, tratamento dentário e programas de estímulo ao aleitamento materno.
A saúde criou dois dos xodós da atual gestão: a queda na mortalidade infantil (veja no quadro abaixo) e as bocas de Primeiro Mundo.
Em educação, o xodó é outro: não faltam vagas para o ensino de 1º grau. O motivo é que Santos foi a cidade que mais absorveu escolas do Estado. Hoje, a prefeitura oferece 35.826 vagas em 33 escolas.
Os tais albergues que o prefeito eleito quer acabar são, na verdade, três casas: duas para crianças de rua e uma para adultos.
Crianças e adultos podem tomar banho, cortar o cabelo e dormir. A prefeitura busca recolocar os adultos no mercado de trabalho e as crianças, junto à família. Quando não há família, busca-se adoção.
"Se isso for desmanchado vai ruir a base social do nosso trabalho", diz Capistrano. Segundo ele, não há assistencialismo porque busca-se mudar a vida da pessoa.
A derrota desse programa nas urnas, afirma, foi resultado do apoio da mídia a Mansur e da divisão do PT na cidade.
Capistrano diz ter certeza de que fez a coisa certa: "Nem sempre a opinião da maioria é a certa", responde, quando lhe perguntam por que seu programa perdeu. Dá dois exemplos: o nazismo e Collor.

Texto Anterior: Lagoa de Jaboatão tem a área de 3.101 campos de futebol e sustenta pescadores e desempregados
Próximo Texto: Rádio impulsionou o vencedor
Índice


Clique aqui para deixar comentários e sugestões para o ombudsman.


Copyright Empresa Folha da Manhã S/A. Todos os direitos reservados. É proibida a reprodução do conteúdo desta página em qualquer meio de comunicação, eletrônico ou impresso, sem autorização escrita da Folhapress.