São Paulo, terça-feira, 31 de dezembro de 1996
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Custo da energia e transporte ferroviário

TELMO GIOLITO PORTO

A decisão de eletrificar uma estrada de ferro é fundamentalmente um problema de análise de investimento. O menor custo do transporte eletrificado deve ser suficiente para cobrir, a determinadas taxas de juros e prazo, o investimento inicial na implantação da eletrificação e ainda atender à manutenção dos sistemas elétricos fixos.
Com um pouco mais de detalhes: a locomotiva elétrica é uma máquina com melhor rendimento que sua equivalente diesel, transporta uma unidade de carga por quilômetro a menor custo, tem dispêndio inferior com manutenção e velocidade maior, o que implica uso mais otimizado (neste aspecto, basta associar o transporte ferroviário ao táxi: quanto mais viagens por período, maior o lucro).
No caso das malhas urbanas, as máquinas elétricas têm, ademais, as vantagens de alta aceleração e facilidade de controle de marcha, necessárias para atender com elevada frequência estações próximas entre si. Por outro lado, a eletrificação exige vultosas aplicações em subestações e rede aérea.
No Brasil, o comparativo clássico apresentado acima precisa ser matizado. O modelo de transporte de carga ferroviário brasileiro aproxima-se mais do americano que do europeu.
Na América do Norte composições longas, com elevada tonelagem, alta carga por eixo e relativamente baixa velocidade percorrem extensas distâncias, carregando produtos de grande volume e baixo valor específico. Na Europa, os trens de carga são menores, mais leves e consequentemente mais rápidos, o que inclusive facilita o tráfego misto com os trens de passageiros, tradicional modo de viagem no velho continente.
Na medida em que as distâncias são enormes, o custo das instalações elétricas fixas torna-se mais significativo, e a tonelagem transportada necessária para viabilizá-lo cresce.
A tal quadro deve-se acrescentar o fato de que o Brasil é um país de capital escasso e caro. Portanto, há natural tendência a se optar por soluções de custo inicial menor, mesmo que deseconômicas a longo prazo. A viabilidade financeira sobrepõe-se à economicidade.
Mas o principal ponto a considerar é o preço da energia elétrica no Brasil. A eletricidade produzida internamente no país, em termos de custo de oportunidade nacional, poderia ser considerada de preço zero.
Seu uso também protege nossas contas externas de variações futuras no preço do petróleo (desde janeiro deste ano, o barril de petróleo já subiu mais de 25%, o diesel no mercado interno acaba de ser majorado), previsíveis tratando-se de recurso natural finito e com aplicações nobres, por exemplo, na química, e não polui a atmosfera.
No entanto, nas relações empresariais entre as operadoras ferroviárias e as concessionárias elétricas, os preços no Brasil são muito altos. A energia para tração ferroviária custa aqui mais do que o dobro que nos EUA e no Canadá. No passado, havia descontos nessa tarifa que foram progressivamente abolidos.
No quadro atual, é ocasião das concessionárias -públicas ou privatizadas- analisarem cuidadosamente sua postura mercadológica. Se mantiverem os preços aos níveis atuais, desestimulando a tração elétrica, perderão clientes importantes e significativo segmento de mercado futuro.
O momento de privatização das ferrovias -quando novos agentes entram no negócio- é crítico. O amanhã do transporte ferroviário eletrificado depende do comportamento das concessionárias a curto prazo.
Vale levantar mais um aspecto: enquanto os fabricantes de locomotivas diesel instalados no Brasil aprimoraram tecnicamente seu produto, os fabricantes de máquinas elétricas -talvez em função de problemas contratuais passados- têm estado pouco presentes no espaço mercadológico brasileiro. Cabe também à indústria elétrica fazer saudável autopromoção.
A opção diesel ou elétrica na ferrovia é mais complexa hoje do que já foi. Cada trecho tem que ser analisado "de per si", à luz dos valores envolvidos na implantação ou recuperação de suas instalações elétricas. A decisão correta para um trecho pode não sê-lo para outro.

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