São Paulo, domingo, 4 de fevereiro de 1996
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Mamonas excessivas

DALMO MAGNO DEFENSOR
ESPECIAL PARA A FOLHA

Há cerca de duas semanas, na maratona de reprises do "Onze e Meia", assisti à pioneira entrevista de Jô Soares com os Mamonas Assassinas, realizada em maio de 95.
Vestidos de Chapolim Colorado, alter-ego super-heróico de Chaves, do SBT, eles falaram abobrinhas de toda espécie, fizeram macaquices e tocaram "Robocop Gay" e "Vira-Vira".
Poucas risadas e minutos depois, me ocorreu que quem assistiu à primeira exibição da entrevista dificilmente teria profetizado o estrondoso sucesso do grupo, simplesmente porque é da natureza das piadas, mesmo as muito engraçadas, só o serem na primeira audição.
Porém, Disraeli já disse, há mais de século, que "nenhuma generalização é inteiramente verdadeira -nem esta"; e disse o Beakman, um dia desses, que uma explosão "é quando as coisas ficam muito grandes, muito depressa". Pois os Mamonas, juntando a sapiência de um e de outro, explodiram.
Em pouco mais de seis meses, os rapazes de Guarulhos venderam mais de 1,5 milhão de discos, fizeram mais de cem shows, tiveram suas canções decoradas por legiões de crianças e adolescentes e tornaram-se os queridinhos da TV -por atraírem audiência como pães doces atraem abelhas.
Se algo havia de profético, na entrevista dos Mamonas a Jô Soares, eram suas fantasias. Chapolim Colorado sempre aparece atendendo a um dramático apelo: "E agora, quem poderá nos defender?".
Pois os programas musicais e paramusicais, uma vez esgotado o filão "sertanejo", andavam carentes de um imã de audiência -e os Mamonas vieram defendê-los.
Caso exemplar: em 4 de dezembro de 95, segunda-feira, o "Programa Livre" com os Mamonas teve um pico de audiência de 21 pontos, segundo o Ibope. De terça a sexta-feira, na mesma semana, a média do programa foi de apenas 5 pontos.
Alguém pode argumentar que não se deve misturar pico e média, por ser uma heresia estatística que costuma dar encrenca; bem o sabem os formuladores de planos econômicos, que convertem preços por um critério e salários pelo outro, e passam meses ouvindo reclamações dos assalariados.
Troco, então, o exuberante pico de 21 pontos pelos ainda notáveis 15, média de audiência na noite dos Mamonas. É comparável, e é o triplo da média dos outros dias: dá e sobra para demonstra o "efeito Mamonas".
Não foi por acaso que, em 21 de dezembro, eles estiveram novamente no "Programa Livre"; no dia 22, no especial da Xuxa; no dia 23, no "Sabadão" do Gugu, tendo duplas sertanejas na preliminar (maior prova de prestígio, impossível); no dia 24, no "Domingo Legal"; e, no dia 31, no "Réveillon do Faustão".
Antes da maratona de fim de ano, já haviam aparecido, além do "Onze e Meia", em todos os telejornais, no "Domingão do Faustão", na MTV e na estréia do "Ponto G", de Adriane Galisteu.
E teriam estado no "Nossa Língua Portuguesa", da Cultura, se o professor Pasquale houvesse feito um "Especial Palavrão" de fim de ano.
Assim como outras centenas de milhares de pais, comprei o CD dos Mamonas atendendo a insistentes pedidos da prole.
Não sendo dotado de surdez seletiva, não tive como não conhecer bem a obra: é um compêndio de baixaria e preconceitos.
A cada execução de "Pelados em Santos" ou "Vira-Vira", hits no toca-discos e na TV, me lembro de minha adolescência, quando fiz a família quase decorar "School's Out", do Alice Cooper, e "July Morning", do Uriah Heep, e arranjo carga suplementar de tolerância.
Mas, que me perdoe o grande DJ lá de cima, ainda acho que é muito castigo para pouco crime.

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