São Paulo, segunda-feira, 12 de fevereiro de 1996
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Os mutirões autogeridos

NABIL GEORGES BONDUKI

O Programa de Construção por Mutirão e Autogestão, promovido pela Prefeitura de São Paulo na gestão Erundina, foi selecionado pelo governo federal para ser incluído no relatório brasileiro a ser encaminhado à segunda conferência da ONU sobre o habitat em Istambul, como uma das 18 práticas bem sucedidas em política habitacional desenvolvidas no país.
O fato coloca em primeiro plano a importância da parceria entre comunidade organizada e poder público no enfrentamento dos problemas sociais e mostra que existem alternativas viáveis, modernas e de alta produtividade e retorno social ao dualismo estatização x privatização, que tem polarizado o debate sobre as políticas públicas.
Diferentemente do que se pensa, o grande avanço revelado pelos mutirões autogeridos implementados por Erundina não está simplesmente no mutirão, trabalho gratuito dos futuros moradores, mas, sobretudo, na adoção da autogestão. Através desse sistema, o poder público repassa um financiamento a associações comunitárias ou cooperativas formadas pelos futuros moradores, que se responsabilizam pela gestão do empreendimento.
Com autonomia para comprar materiais e contratar assessoria técnica e mão-de-obra especializada para a construção, as associações alcançam resultados superiores aos obtidos pelo poder público. Materiais são adquiridos por um preço inferior; técnicos contratados diretamente produzem projetos adequados aos desejos, possibilidades e expectativas dos moradores; o desperdício é reduzido.
A economia conseguida pelos mutirantes é apropriada inteiramente por eles mesmos, revertendo em melhor qualidade e acabamento da casa.
Ao contrário da promoção privada capitalista, onde esses expedientes acabam apropriados como lucro, nos mutirões autogeridos eles garantem qualidade na moradia e economia para a prefeitura construir mais unidades.
O programa de São Paulo, onde foram viabilizadas mais de 11 mil habitações de até 60 m2, em casas ou prédios de até cinco andares, mostrou que o sistema pode possibilitar a edificação de qualquer tipologia habitacional, a um custo 40 a 50% inferior ao de processos convencionais. A qualidade dos projetos e obras chegou a suscitar uma crítica curiosa da atual administração municipal, que paralisou injustificadamente o repasse dos recursos para os mutirões: "As casas eram boas demais para os pobres!" Sem comentários!
Habitação digna, baixo custo, tecnologia adequada, projetos inovadores, iniciativas como creches, cursos de alfabetização, salões comunitários, rádios e áreas de lazer são resultados visíveis da autogestão em quase cem empreendimentos em toda a cidade.
Um exemplo que o Brasil levará a Istambul para mostrar ao mundo no Habitat 2, mas que está inacabado pela teimosia política do prefeito, que insiste em não reconhecer positivamente um programa criado pelo governo Erundina.

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