São Paulo, segunda-feira, 26 de fevereiro de 1996
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Experiência não se acha no armazém

MARCELO FROMER; NANDO REIS
ESPECIAL PARA A FOLHA

É bem curioso o que ocorre com boa parte da opinião pública e da crítica esportiva. Depois da primeira apresentação da nossa seleção pré-olímpica, após o espantoso resultado de 4 a 1, uma saraivada de duras críticas foi disparada do Brasil em direção ao esquadrão que folgava em Tandil.
O ataque, aparentemente procedente, era quase que imbecil, pois o rigor férreo das cobranças e das reprimendas errava por completo o seu alvo.
Com o pé mais torto do que os daqueles a quem miravam suas farpas, os críticos irrequietos preferiram acusar os atletas, como se fosse exclusivamente deles a responsabilidade pelo mau desempenho. Alguns mais afoitos já sugeriam alterações, apontavam graves deficiências na personalidade de alguns atletas, naquela velha ladainha de que "esse aí não é atleta de seleção, só joga bem no clube".
Não foi proferida, nem dita, nem escrita e, portanto, não foi lida uma única linha de um raciocínio que em algum momento tangesse, mesmo que por hipótese, alguma parcela de responsabilidade do técnico. Parecia até que Zagallo, com sua sorte costumeira, havia conquistado o placar dilatado, quase injusto, enquanto que para os jogadores sobrava a culpa de terem jogado mal.
Isso sem contar que soprava um vento de fazer inveja a Júlio Verne, e o campo parecia mais uma rinha de galos de briga!
Ora, se são apenas os jogadores os responsáveis pelo que ocorre em campo, para que então técnico, comissão técnica e o escambau? Vamos deixá-los todos em casa, gozando de seus salários nada olímpicos, aliás, profissionalíssimos!!
Estamos atrás de um novo modelo, atrás de uma renovação, não só de certidões de nascimento, mas também à procura de um outro espírito para o futebol brasileiro. Se Zagallo vem sendo apontado como o cajado que guiará a mão do nosso futebol na travessia da próxima Copa, se de sua sábia cabeça branca ouviremos os gritos que nos darão rumo e certeza nos próximos tempos, que ele também seja o responsável pelas horas amargas.
Ou será que estamos diante de um colecionador de marcas e superstições, com sua vaidade exacerbada, procurando se instalar como um verbete no próximo Guinness Book?
Estamos aqui dando nosso apoio a essa jovem seleção, que, com sua saudável inexperiência, busca construir a sua personalidade, trilhar o caminho, mirar com seu próprio rosto o Sol. Talvez sem precisar tanto de velhos Zagallos, futuros Dungas e até mesmo de vindouros Romários. Boa sorte, rapazes!!

Marcelo Fromer e Nando Reis são músicos e integrantes da banda Titãs

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