São Paulo, domingo, 3 de março de 1996
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Pesquisador do MIT critica a atual "cultura do desemprego"

CARLOS EDUARDO LINS DA SILVA
DE WASHINGTON

Olivier Blanchard, professor de economia do Massachusetts Institute of Technology (MIT), uma das mais respeitadas instituições de ensino e pesquisa dos EUA, discorda da tese de que tecnologia gera desemprego.
Ele analisou em computador os números de desemprego e de avanço tecnológico nos últimos cem anos e concluiu que não há uma relação direta, muito menos causal, entre os dois fenômenos.
"Se alguma relação pode ser inferida dos números, é a de que, quanto mais rápido é o progresso da tecnologia, menor o desemprego", disse Blanchard em entrevista à Folha.
Ele dá como exemplos as décadas de 1950 e 1960, de acelerado avanço tecnológico e de intensa criação de empregos.
A análise de Blanchard leva em consideração décadas e anos. "Para quem perde seu emprego, uma década é um tempo grande demais. Por isso, resolvi cruzar os dados de cada ano nos últimos cem."
Segundo ele, os resultados são de que o desemprego pode subir um pouco num ano em que o progresso tecnológico é muito rápido, mas o efeito dura pouco e em dois ou três, no máximo, desaparece por completo.
"Eu não quero minimizar o problema de quem fica desempregado. Na microanálise, há vencedores e perdedores e os perdedores sabem quem são uns e outros", diz.
Entre os perdedores, ele coloca em primeiro lugar as pessoas de meia-idade treinadas para desempenhar tarefas que estão sendo extintas pela tecnologia. "Eles estão tendo muitas dificuldades", afirma.
Mas Blanchard não vê muita diferença entre a aflição vivida pelos desempregados do final do século 20 com as experimentadas pelos seus correspondentes no início do século.
"Empregos vão ser criados em outros lugares, em especial no setor de serviços. Uma infinidade de novos serviços aparecem a cada ano. Eu não sei onde, nem como. Mas sei que vão ser criados", afirma Blanchard.
Ele cita exemplos, como as funções de assistência aos usuários de serviços "on line" de computadores e argumenta que é fácil ver que há demanda por mais gente nesses trabalhos: basta tentar usar esses serviços por telefone e checar quanto tempo é necessário esperar por uma resposta.
O argumento de que, ao contrário do final do século 19, os novos empregos agora exigem treinamento sofisticado é rebatido por Blanchard.
Ele acha que os camponeses que tiveram de aprender funções industriais há 150 anos devem ter experimentado desconforto similar ou superior aos dos atuais desempregados treinados para novas tarefas, porque a difusão da tecnologia agora é muito mais disseminada do que no passado.
"Há diferentes tipo de progresso tecnológico. Compará-los, em situações históricas tão diversas, nem sempre dá certo", ressalta.
Blanchard, 45, acha que "a evidência oferecida pelos últimos cem anos é muito clara e indiscutível".
Ele ataca o que chama de "cultura do desemprego", definida como uma visão pessimista do futuro baseada em estatísticas do presente e calcada numa certa tolerância com o fenômeno provocada pelas redes de suporte ao desempregado, em especial em países da Europa ocidental.
As altas taxas de desemprego naqueles países são responsabilidade, segundo o argumento de Blanchard, de políticas econômicas incorretas dos governos, incapazes de se antecipar aos fatos.
(CELS)

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